Comparação: DSG x Powershift

Pudemos dirigir com certa assiduidade recentemente três carros equipados com câmbios de dupla embreagem e assim conseguimos compilar material para comparar as filosofias diferentes destas caixas. Os carros foram um Jetta Highline 2.0 TSI, com o DSG de seis marchas lubrificado a óleo, um Golf Highline 1.4 TSI, com o DSG de sete marchas e embreagem a seco, e um Focus Sedan Titanium 2.0 com o Powershift de seis marchas e embreagem a seco.

Os DSGs são muito parecidos em comportamento e não negam a origem em comum. São câmbios assumidamente de dupla embreagem e seu funcionamento exemplifica claramente os prós e contras destes mecanismos. Quem quiser entender um câmbio de dupla embreagem em sua essência, deve partir para um DSG.

Tanto no Golf como no Jetta, chama a atenção a rapidez e absoluta suavidade na troca das marchas. Nota-se que a troca ocorreu somente pelo movimento do conta-giros, pois na condução normal é quase como se fosse um CVT, sem o inconceniente da chatice. As trocas são instantâneas. Imagine-se numa situação de média exigência de potência, com trocas de marcha a 3500-4500 rpm. Nos DSGs a sensação é de estar à frente de uma locomotiva, pois a marcha muda e o motor continua empurrando como se nada tivesse acontecido (claro, aqui méritos também para o amplo torque dos motores turbinados). Em uma volta rápida com um Audi A3 1.8T, cujo câmbio em teoria é o mesmo do Golf, notamos uma calibração mais esportiva, com ligeiro corte de potência na mudança de marcha, como se fosse um “tapa na nuca” quando da reaceleração. Não é o caso destes VWs.

As reações aos comandos de trocas manuais, tanto pela alavanca de marchas quanto pelos comandos atrás do volante,  são instantâneas ao subir marchas, e quase-instantâneas com delay de décimos de segundo nas reduções – necessário pois o motor sobe de giros para o encaixe da embreagem como num bom punta-tacco. Não é do câmbio, mas gostamos bastante que nos dois carros é possível saber qual a marcha em uso mesmo em D.

Ambos os câmbios também de certa forma “disfarçam” o menor torque em baixíssimas rotações ao utilizarem a primeira marcha bastante curta. Não tenha dúvidas que este é um dos segredos para as espetaculares acelerações dos dois carros – Jetta em 7,3s e Golf em 8,9s no 0 a 100 km/h. Na condução esportiva, esta primeira marcha curta isso se reflete em perda de aderência nas rodas quando o turbo entra; no Jetta, mais potente, é muito difícil acelerar do zero mesmo com pressão média no acelerador sem acionar o controle de tração.Na condução normal pouco se nota, pois os câmbios mudam para segunda marcha tão logo o carro saia da imobilidade. Na verdade, ambos os câmbios colocam segunda sem ser necessário acelerar, somente com o creeping.

As diferenças entre os DSGs são poucas. Uma delas é o escalonamento das marchas. O DSG de 7 marchas é voltado a carros menos potente, e por isso mesmo usa um escalonamento mais curto. A sensação é a de que a sétima marcha no Golf é equivalente à sexta marcha no Jetta. No Golf, isso acaba resultando num exagero de marchas; em certas situações nota-se o câmbio mudando frequentemente de segunda para terceira, de novo segunda, de novo terceira, especialmente em situações de tráfego em baixa velocidade. O DSG do Jetta é mais decidido – o que é mais fácil, pois tem mais potência e torque para trabalhar.

Outra diferença, mas que talvez possa ser creditada às unidades testadas, é que o acionamento da alavanca de marchas do Jetta (em P, R, N, D e S) é mais duro, nota-se claramente o câmbio passando por todos os estágios ao sair de P e colocar em D por exemplo. A sensação é a de que ele é mais mecânico. No Golf, sair de P para D se faz com um dedo.

O principal incômodo destes DSGs, e que se nota em ambos os carros, se dá na situação específica de redução de velocidade a quase zero, para depois retomada rápida de aceleração. O exemplo clássico é ao se chegar a um cruzamento no qual temos a preferencial, mas optamos por reduzir o ritmo para checar se não tem nenhum desavisado na outra rua, ou então quando existem valetas a ser transpostas. Os DSGs podem reagir de duas maneiras. A mais comum é manterem segunda marcha e acelerarem. Nesta situação, a menos de 1500 rpm, os turbos dos motores ainda não entraram em ação com força e o desempenho sofre (não que seja verdadeiramente lerdo. É mais sensação do motorista, que está acostumado com o empurrão nas costas do turbo e nesta situação específica não tem). É algo bem desagradável quanso se quer cruzar a rua logo, pois algum carro vem na outra rua, e o carro acelera lentamente. A reação menos comum, que acontece quando o motorista solta uma patada no acelerador, é a redução para primeira – que é muito curta, como vimos. Aí a aceleração é instantânea e normalmente excessiva, sendo que no Jetta “cantar pneu” é comum. Também não é agradável.

Por fim, o DSG a seco do Golf apanhou bastante na internet a respeito de ruídos metálicos emitidos quando se trafega em baixa velocidade em piso irregular. Fizemos este teste no Golf avaliado e não ouvimos nada. De todo modo, não temos o hábito de rodar por ruas irregulares e muito menos de vidro aberto. No uso, com exceção da alavanca mais rígida no Jetta, não há nada que denote falta de robustez no Golf.

Já o Powershift obedece uma filosofia diferente. A origem desta filosofia pode ser a base norte-americana da empresa, pensando no perfil do comprador norte-americano que está acostumado aos câmbios automáticos convencionais epicíclicos – e que eram bem pouco eficientes até pouco tempo -, ou então pela simples necessidade prática de acoplar o câmbio a um motor aspirado. Esta dúvida só poderemos sanar quando tivermos um EcoBoost Powershift no Brasil. Vale notar que a Volkswagen adota um câmbio automático convencional em muitos carros voltados ao mercado norte-americano, que na Europa usam DSG.

O que se nota, ao dirigir o Focus com Powershift, é um funcionamento muito parecido com o de um câmbio automático convencional. A caixa permite certo “deslizamento” da embreagem simulando um conversor de torque.

Este comportamento fica claro em pequenas acelerações muito suaves. Você demanda um pouco de potência com o acelerador, o motor sobe de giros e só instantes depois isto se transforma em velocidade. No DSG a reação é a de um câmbio manual: os giros sobem e a velocidade aumenta instantaneamente.

As trocas de marcha também são menos abruptas. O DSG troca de marcha tão rápido que o conta-giros não acompanha a troca em tempo real, mesmo “despencando”. No Powershift a troca de marchas e a queda de rotações é mais gradual, como se um conversor de torque estivesse deslizando.

É importante frisar que isto não faz o Powershift menos suave. Na condução normal, as trocas são imperceptíveis e imediatas, assim como no DSG. Ao andar rápido, este pequeno deslizamento atrasa por milésimos de segundo a entrega de potência.

Por outro lado, este comportamento torna o Powershift melhor na situação crítica do DSG que descrevemos acima, em baixas velocidades. Na mesma situação, o câmbio permite certo deslizamento que “chama” o giro do motor e lá está a aceleração necessária para cruzar a rua. Também é importante reforçar que, como o Focus não tem o alto torque em baixos giros dos motores turbo, muito dessa diferença é a sensação de velocidade esperada pelo motorista guiando os dois carros.

Em termos de calibração, com os câmbios em D, ambos se adaptam rapidamente ao estilo do motorista, buscando máxima economia em condução normal (o motor está frequentemente abaixo dos 2 mil giros). Caso o motorista esteja mais valente, eles seguram mais as marchas mesmo em D. O programa esportivo elimina a última marcha no Jetta e no Focus (não testamos no Golf) e segura as rotações para máximo desempenho. Um ponto superior do Powershift em relação ao DSG é por permitir arrancadas rápidas – segura-se o carro com o pé esquerdo no freio e o Focus acelera até 2500 rpm antes de arrancar. Nessas condições o DSG não permite aceleração do motor.

O comportamento em relação ao freio-motor também difere. No DSG de seis marchas do Jetta, a programação é bastante eficiente para gerar freio-motor mesmo em D. Nosso percurso de teste com os três carros inclui uma avenida com subida e descida seguidas e bem acentuadas, e no Jetta o câmbio sempre mantém a mesma marcha na descida – no caso, terceira. O DSG do Golf normalmente passa a marchas superiores, a não ser em caso de tirada repentina do pé do acelerador. O Powershift aqui também remete a um câmbio automático convencional e passa a marchas superiores. É possível creditar o comportamento do Powershift (e principalmente do DSG do Golf) a esta nova tendência de economia de combustível que é o retorno da roda-livre, ou seja, a eliminação ou redução do freio-motor para se aproveitar melhor a inércia. Vale notar que, com start-stop e arquitetura no geral mais moderna, o Golf se vale de bem mais recursos visando a economia de combustível do que o Jetta – ou mesmo o Focus.

Onde o Powershift é claramente inferior ao DSG, e aí não é uma questão de câmbios mas sim de opção das fabricantes, é a interação com ele. No Golf e no Jetta é possível trocar as marchas por um canal à direita da alavanca ou por aletas atrás do volante. Mesmo em D, a marcha selecionada pela aleta se mantém por um tempo entre 5 e 10 segundos antes que o câmbio volte automaticamente a D. Ao usar comandos manuais com o câmbio em S, eles só retornam ao automático quando a alavanca voltar para D.

No Focus, ao se comandar uma redução pelo botão na alavanca com o câmbio em D, ela acontece e em menos de dois segundos o câmbio volta à marcha anterior (a não ser que a velocidade tenha caído muito). Para que as reduções sejam mantidas, somente com o câmbio em S – situação na qual a marcha selecionada também aparece no painel.

Por fim, a movimentação da alavanca no Focus é uma delícia, suave como no Golf.


Não é intenção do M4R dizer qual é “melhor”. Cada motorista terá suas preferências, e recomendamos como sempre que se dirija os carros para tomar a decisão de compra. Muito mais que o funcionamento dos câmbios, o que diferencia estes carros é a presença de turbo, cujo aumento de potência e principalmente torque mudam bastante o comportamento de um carro.

Comentários

Anônimo disse…
Parabéns! muito bom o relato da experiência com os 3 câmbios. Mas continuo preferindo os manuais. Só compraria um automático ou automatizado se morasse em capital. Gustavo.
Marcelo disse…
Excelente o post.

Vou falar do DSG do Golf que é o meu carro.

1) Em modo Sport ele elimina a sétima.
2) Em situações de descidas, ele usa freio motor esticando até mais de 4000rpm se for necessário. Se você der um toque bem sutil no acelerador, ele entende que você não quer o freio motor e já solta o carro, seja adiantando uma marcha, seja entrando em roda livre. Se você não acelerar ele entende que você quer o freio motor e mantém a marcha.
3) Em drive se acionar a borboleta ele reage reduzindo ou aumentando marcha e depois retorna sozinho,como você bem observou. Você pode voltar dando um toque pra trás na alavanca ou segurando a borboleta da direita por 3 segundos. Mas se estiver descendo uma serra, por exemplo, mesmo em drive ele não retorna ou adianta as marchas. Esse fim de semana desci a serra de Campos do Jordão inteira assim, trocando no volante com o câmbio em Drive e só mudava as marchas ao meu comando.
4) A situação que você descreveu de trocar rápido para segunda e às vezes te deixar com pouco torque aparente é real. Minha vaga de garagem é no subsolo e o início da rampa é praticamente ao lado da minha vaga. Basta eu colocar o carro em movimento que ele logo já muda pra segunda e no meio da rampa parece que tem pouca força. Mas é pura impressão. Basta pisar em segunda mesmo que vai. Mas isso só acontece com pouca pressão no acelerador. Se chegar mais rápido no cruzamento e parar, ao reacelerar com mais vontade ele mantém e estica a primeira.
5) Mesmo o 1.4T tendo menos torque que o 2.0T do Jetta, é comum o carro dar umas destracionadas de vez em quando.
6) Não sei nos Golf sem o modo de conduções que tem do Elegance em diante, mas no meu o roda livre só aciona se eu estiver em modo Economia. Em Drive ou Sport ele não aciona e também não aciona se estiver com o controlador de velocidade ligado. Nesse caso, controlador, ele usa em descidas o velho e bom cut off mesmo.

Já tive outros automáticos tradicionais, CVT também, mas esse DSG é incomparável.

Espero ter ajudado.

Abraço,
Marcelo Schwan
Ronaldo disse…
Somente uma correção. No jetta da pra fazer o launch control sim. Para isto, deve se instalar o ASR off e pisar no freio com o pe esquerdo e tacale pau.
Jorge Gama disse…
O meu Golf TSI DSG é o mexicano 15/15 e infelizmente não tem o "Roda Livre"
De qualquer forma, parabéns pelo texto, expressa muito bem o comportamento do DSG do Golf TSI
Acrescento um problema que muitos reclamam, retenção de marcha em pisos irregulares, principalmente na 1a ou 2a marcha. Muitas vezes ele reduz da 3a para 2a nesta condição. Em geral a rotação segue até 3000RPM ou um pouco mais. Esta situação ocorre mesmo pisando bem leve no acelerador.
Tem um detalhe: A retenção geralmente ocorre 3 entre 4 vezes que se passa num piso irregular, não vejo explicação para tal.
Mas no geral, o câmbio é show!
Compraria novamente sem pestanejar.
Marcelo Silva disse…
Bellissimo texto, eu acabei de adquirir um Focus Powershift, e a primeira impressão foi incrível, e de facto comparei com o DSG do Passat 2.0T e 3.2 V6, tive uma sensação bem similar. Porém meu mecânico de confiança disse que estes câmbios são complicados e não estão se adaptando ao Brasil, talvez pela pavimentação, todavia estou muito satisfeito e por ele não ser um AT convencional, temos de adaptar um pouco o uso, não tem como utilizar da mesma forma que se conduz com CVT, então estou no período de adaptação.

Abs

MS
ALlan disse…
Belo texto.
eu acabei de adquirir um Focus 2.0 PS e estou gostando muito do câmbio apesar de ter visto reclamações na internet. Eu tinha um Focus 2009 de câmbio automático convencional e eu já gostava. Mas o Powershift é muito ágil e não dá trancos como eu esperava. essa dupla embreagem funciona bem. o focus 2009 era hiper esperto, o câmbio suave, mas o Power Shift com o motor de injeção direta dão um desempenho impressionante.
Unknown disse…
Relato minhha experiência com o Golf 2014 TSI 1.4 Highline alemao. O carro eh fantastico. Sim, ha barulho do cambio, mas absolutamente compensado pelo funcionamento impecavel das trocas de marcha e funcionalidades do modo S e das manoplas do volante. Porem, enfrentei a falha do cambio. Primeiro somente entravam marchas impares, depois somente a primeira. Com medo de enfrentar 350km dd volta a Sao Paulo deixei o carro na consecionaria em Orlandia. Apos 15 dias substitiram a mecatronica e tudo ficou OK. Abri uma reclamacao formal na fábrica e, apesar de lentos, scompanharam serviço de perto. O problema foi que o carro ficou sem a funcionalidade da "roda livre". Minha consecionaria de sempre, Amazon da Av. Pompeia em São Paulo não sabia do que eu falava e não identificaram o problema. 8 mil kms depois, por falta de um retorno tanto da consecionaria como da VW e falta de tempo minha, na revisao seguinte o chefe da oficina entendeu a situaçao e confessou uma demora da fabrica em corrigir o problema via Softwere. Problema resolvido e carro perfeito de novo, agora com 53mil kms. Esse modelo alemao eh muito melhor que o mexicano e principalmente o brasileiro.
Tenho um Focus 2.0 17 zero queixa, eu esmerilho o carro, só ando no S, zero trabalho, zero manutenção, só alegria o meu, gostaria de mais potencia e colocar um botão a mais para desligar o controle de tração sem ter que entrar pelo menu do computador de bordo, fora isso perfeito

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