Teste: VW Bora 2.0 automático total flex

Se eu não tivesse padronizado os títulos dos testes com os nomes das montadoras e dos carros, bem que este post poderia chamar-se: “Pode um câmbio salvar um carro?” É bem esse o caso do Bora.

Já falei do carro aqui algumas vezes. O Bora chegou ao Brasil em 2001, importado do México (como é até hoje). É a versão sedã do Golf IV, lançado na Europa em 1998 e que temos aqui até hoje, após um face-lift medonho realizado em 2006. Já o Bora também apresenta nova frente e traseira, desta vez operadas pela VW chinesa. Enquanto a inspiração das mudanças cosméticas do Golf brasileiro vieram do próprio Golf V europeu, os chineses tomaram detalhes do Passat para o Bora – mas não do Passat atual, e sim do imediatamente anterior, vendido aqui de abril de 2000 até 2005. O resultado não agrada em nenhum dos dois, mas neste concurso para decidir o menos feio, o Bora ganha pela elegância da traseira e pelos detalhes interessantes como as setas embutidas no parachoque dianteiro.

Quem acompanha este blog há tempos conhece meu caso de amor e ódio com o carro. Em 2001 o Bora era um sedã compacto e elegante, de desenho esportivo e acabamento impecável. Àquela época o motor era adequado e o pacote de opcionais bem completo, o que se fazia notar no preço: era muito mais caro que a concorrência. Daí as vendas nunca terem decolado. Veio a reestilização chinesa e a fervura no segmento dos médios, agora vendendo como nunca e com muitas opções atualizadas com o resto do mundo: Civic, Corolla, C4, Focus e mesmo produtos ainda interessantes como Mégane, 307, Linea.

O concorrente da VW nessa categoria lá fora é o Jetta, que é a versão sedã do Golf V. É comparável a eles em porte e só custa mais caro por conta da ganância da VW e também pelo pacote completo de opcionais. Na Europa é possível ter um Jetta com câmbio e ar manuais, bem como motores mais modestos. A 60 mil reais, seria muito atraente.

Antes, no entanto, de bater com os dois pés na Volks, lembremos que a plataforma do Golf V tem um problema mundial, que é ser de construção cara. Isso tem inviabilizado a venda do carro em uma série de mercados, e foi inclusive uma preocupação para se fazer o Golf VI, lançado recentemente lá fora. É também um dos motivos do Jetta ser tão caro.

Inviabilizada a opção do Jetta – e não me entendam mal, se este carro fosse vendido aqui a 70 mil a VW ainda teria lucro, então há muita ganância nessa história -, a VW optou por manter o Bora à venda em diversos mercados emergentes ao redor do mundo, como opção de sedã mais barato. É assim no México, na China, e também no Brasil. Ou seja: o sedã que era caro demais é agora a opção que apela para o custo-benefício. E faz sentido: o carro está com o preço congelado há mais de três anos, na faixa de 60 mil. Ganhou a reestilização chinesa e perdeu alguns detalhes (falaremos mais adiante), mas manteve o essencial: duplo air bag, freios ABS, ar digital e outras amenidades.

Então o custo-benefício faz do Bora um bom carro? Não. Como sempre, depende do comprador. Se ignorarmos por um instante o Fusion custando absurdos 64 mil, temos uma concorrência interessante nesta faixa: Focus GLX, Nissan Sentra, Fiat Linea, Vectra Elegance. O primeiro é o melhor de todos, embora com acabamento sofrível e aceitando apenas gasolina. O segundo é desconhecido e também não é flex, mas a lista de equipamentos é razoável. O Linea vem com o Trancologic, aquela aberração automatizada, mas fora isso é um carro espaçoso e completo, embora com falhas de acabamento; e o Vectra é amplo e equipado, mas tem refinamento zero.

Como todos têm seus prós e contras, o Bora traz suas armas para o jogo. Se o estilo não é o melhor do mundo, também não se pode fizer que o carro ficou feio. Por dentro é o mesmo ambiente do Golf nacional; não é um painel muito inspirado, mas em compensação os materiais são de qualidade e os encaixes, primorosos. Algumas coisas se perderam ao longo dos anos: o tecido dos bancos poderia ser melhor; o motorista não conta com alça de teto ou porta-óculos, só um buraco; as outras alças perderam o retorno suave característico da linha; a iluminação nas portas se foi; e o porta-copos espetacular, embutido no painel, virou um buraco ao lado do freio de mão. Mas nem tudo é desespero: os para-sóis seguem iluminados e com tampa; o material do painel é macio e emborrachado; as maçanetas internas são cromadas e o acionamento das alavancas é firme na dose certa. Nesta época de empobrecimento de interiores, ter um acabamento à moda antiga passou a ser uma qualidade.

Achar a melhor posição ao volante é simples, já que o carro conta com ajuste de altura e profundidade do volante e de altura do assento, que por sua vez é bastante cômodo e de bom apoio nas curvas. O volante não é um primor como o do Punto, e o material poderia ser mais macio, mas tem boa pega. É um carro que veste o motorista, característica da linha Golf.
Andar com o Bora é um constante diálogo entre o velho (o motor) e o novo (o câmbio). O motor vibra acima de 4000 rpm e é bem amarrado em alta. Em nenhum momento há um surto de potência, com entrega linear ao longo de toda a faixa de trabalho. Mas o torque é bom, 17,3 m.kgf a 2400 rpm, e o câmbio coloca toda sua tecnologia em campo.

Ah, o câmbio. Merece até um desatque especial, um parágrafo só para ele. É uma unidade fabricada pela japonesa Aisin, com seis marchas em configuração 5 + E e bloqueio do conversor de torque em todas as marchas, menos a primeira. Isso significa que não há aquela sensação de patinação que acomete os câmbios mais antigos. Sair em baixa velocidade, por exemplo, algo que é um martírio nos câmbios de quatro marchas (ou ele reduz para primeira à base de um tranco, ou sai em segunda patinando e jogando combustível pela janela), é tranquilo: o câmbio mantém segunda e bloqueia o conversor, aproveitando o amplo torque para uma saída eficiente e econômica. O fato de possuir seis marchas coloca o câmbio sempre trabalhando a seu favor: seja trocando as marchas em baixa rotação, e sucessivamente, se o câmbio entender que o motorista conduz de maneira econômica, ou eleva o giro bastante ao ver que há necessidade de potência. E o câmbio sabe bem diferenciar uma situação da outra.

A sexta marcha permite economia nas estradas, embora 3 mil rpm a 120 km/h sejam rotações excessivas para um câmbio de seis velocidades acoplado a um motor que gira em baixa. O comando de trocas manuais é excelente, rápido e suave nas mudanças. Permite ainda retomar velocidade com acelerador bem aberto sem reduzir marcha, opção que favorece a economia. Há ainda uma posição S, esportiva, que realiza as trocas em altos giros.

Aqui eu gostaria de colocar um parêntese mais pessoal. Não sou fã de automáticos. Respeito demais o conforto que eles propiciam, mas até hoje a ineficiência do conversor de torque e a falta de suavidade dos câmbios automatizados não tinham me convencido. Este câmbio deu um sério abalo nesta convicção. É o mais próximo que temos das unidades de dupla embreagem que realizam as trocas instantaneamente, e é o primeiro câmbio automático que soma, e não subtrai, do prazer ao dirigir de um carro.

Andando, o resultado é que o Bora torna-se um carro mais ágil do que o motor permitiria, e seus resultados em aceleração e velocidade máxima equiparam-se aos de carros com 20 cv a mais de potência – e câmbios automáticos ultrapassados. É realmente frustrante não se poder ter tudo; se o motor é suave, torcudo e potente como o 2.0 PSA, é beberrão e acoplado ao pior câmbio automático da indústria; se o motor é bom como o 1.8 Honda e o câmbio também, ambos não se entendem, como é no Civic; e se o câmbio é mil maravilhas, o motor não ajuda, como no Bora. Pelo visto, somente o Jetta escapa desta sina...

Um outro fato que ajuda o desempenho do Bora é o fato de ele ser um dois-lugares. Sim, estou exagerando, mas o fato é que, com a pequena distância entreeixos de 2,51 metros, o Bora está mais pra Punto (com exatamente a mesma distância) e Polo (2,46m) do que para Civic (2,7m) e Corolla (2,6m). O resultado é um espaço exíguo atrás, menor até mesmo que o do Polo Sedan, que se beneficia de uma artimanha da VW, com o banco traseiro mais inclinado do que de costume; ganha-se em espaço para a cabeça e para as pernas, às custas da posição mais ereta. Algumas pessoas acham extremamente incômodo, o que não é o meu caso. De qualquer maneira, o Bora está longe de ser espaçoso. O porta-malas ao menos é interessante, totalmente revestido, com dobradiças pantográficas e 455 litros de capacidade.

A suspensão herda o bom comportamento do Golf, embora aparente ser mais confortável, mesmo com rodas 16” e pneus 205/55 R16. Não é um carro molenga, longe disso: absorve bem as iregularidades do piso e entrega boa dose de estabilidade, embora a carroceria role mais do que o desejável. Está muito longe da excelência do Focus, mas é mais suave que o Civic e mais duro que o Corolla, um compromisso interessante. Não é um carro que instiga o motorista a andar forte, apesar do câmbio esperto e do ronco instigante do motor (o Polo Sedan é bem mais “nervosinho” neste aspecto), mas causa boas supresas ao motorista que conduzi-lo assim. E quem for fã da suavidade pode aproveitar o ar digital, o apoio de braço dianteiro e o silêncio a bordo.

Se eu compraria? É uma questão de avaliar qual frustração você deseja levar para casa. Minha opção de sedã automático nesta faixa de preço é o Focus GLX, que me frustrará todos os dias com o acabamento aquém do esperado, o consumo exclusivo de gasolina e o câmbio ruim (e será só alegria em diversos outros quesitos). O Sentra, outra opção válida, frustra pela dureza da suspensão, pelo fato de também só beber gasolina e pela incerteza na hora da venda (embora seu câmbio CVT rivalize em eficiência com o do Bora) . E o Bora frustra pelo motor amarrado e pelo porte compacto, com efeitos nefastos no espaço interno. Mas dá o orgulho de dirgir o carro com o melhor câmbio automático abaixo de 100 mil (desconsiderando o Jetta), assim como o Focus dá orgulho de dirigir o carro com a melhor suspensão abaixo de 100 mil. Ao final, prefiro ainda esperar o Focus flex, mas confesso que lembraria do Bora em todas as trocas de marcha.

Estilo 4 – Tá, feioso não ficou. Mas também não ficou atraente. As terceiras gerações de Gol e Palio provam que é possível manter a beleza do carro alterando-se apenas frente e traseira, mas estas são exceções ao invés de regras. O melhor ângulo é disparado a traseira.

Imagem – A esportividade do modelo anterior se perdeu na revitalização chinesa. É um carro masculino, para pessoas mais velhas. Pode ganhar jovialidade com alterações nas rodas. A ampla gama de cores (preto, grafite, prata, grafite, prata, preto, grafite, preto e prata) também não
permite muita coisa.

Acabamento 8 – Perdeu itens como o retorno suave das maçanetas e a iluminação nas portas, mas o que destoa mesmo é o tecido um tanto pobre (pior nas portas que nos bancos). Com couro a nota é um sólido 9.

Posição de dirigir 10 – Amplas regulagens, pedais alinhados, banco bastante confortável e com bom apoio lateral. Só o volante poderia ter uma pega melhor.

Instrumentos 9 – O básico, mais um excelente computador de bordo. Eu gosto da iluminação em azul, acho elegante.

Itens de conveniência 8 – Vem bem completo. Tudo o que se espera de um carro nesta faixa está aqui: ar digital, trio elétrico, alarme com telecomando. O bem-vindo teto-solar é o único opcional e merece destaque. Sensor de estacionamento, só na concessionária. Piloto automático, só escolhendo outro carro. Daí a nota 8.

Espaço interno 5 – O cinco refere-se ao espaço à frente, que é bom para duas pessoas. Atrás o bicho pega, notadamente no espaço para as pernas. Ocupantes com mais de 1,80 também batem a cabeça o teto. É lugar para gente pequena ou trajetos curtos.

Porta-malas 10 – Dobradiças pantográficas, revestimento total, estepe de uso normal, 455 litros. Nada que desabone.

Motor 4 – Bom torque em baixa, silencioso e não é um consumidor voraz de combustível. Mas vibra em alta rotação, carece de recursos tecnológicos e a entrega final de potência é muito baixa em relação ao deslocamento. Faz parte do trio de motores mais atrasados do mercado, juntamente com o 2.0 e o 1.8 da GM.

Desempenho 6 – No papel, 120 cv não dariam para o cheiro. Na prática, não há falta de potência em nenhum momento, a não ser nas puxadas realmente esportivas, acima de 5 mil rpm. Na condução normal, dá conta do recado. Prova disso é o tempo de aceleração de 0-100 km/h na casa dos 11 segundos, mesmo tempo atingido pelo Focus de 25 cv a mais.

Câmbio 10 – Eu queria dar nota 11. Seis marchas, bloqueio do conversor do torque, opção de trocas manuais, tudo rápido e ágil. É pra aplaudir de pé.

Freios 9 – Disco nas quatro rodas, com ABS. Faltou o EBD, mas o carro estanca direitinho. Os pneus largos ajudam.

Suspensão 7 – Conceito antigo com eixo de torção na traseira, porém bons resultados. É mais confortável do que estável, mas muito longe de ser uma banheira. Toma curvas direitinho e demora a reclamar. Só a carroceria que oscila demais.

Estabilidade 6 – Do quarteto de sedãs da VW (Voyage, Polo, Bora e Jetta), é o menos estável. Ainda assim, toma curvas com confiança e demora a entregar os pontos.

Segurança passiva 6 – Apesar de oferecer o mesmo pacote que o Focus (ABS e air bag duplo), a nota aqui é maior pelo preço inferior do carro. Bolsas laterais ao menos como opcionais seriam bem-vindas.

Custo-benefício 8 – O pacote de equipamentos é adequado, o câmbio é excelente. Fica devendo em espaço interno e no motor antiquado. Mas reúne argumentos sólidos para os interessados em sua compra.

Comentários

Anônimo disse…
Amigo, ouvi dizer que este câmbio tiptronic quebra com certa facilidade e seu concerto gira na casa dos R$10.000. Esta informação procede?
Dubstyle disse…
Caro, não que eu saiba. Esse câmbio é usado pela VW em diversos carros ao redor do mundo e não se sabe de nenhum problema de confiabilidade. O Jetta e o Golf são vendidos na Europa com esse câmbio há um bom tempo e não existem reclamações. Agora, se quebrar, é bem possível que o conserto seja nessa faixa de preço mesmo. Câmbios automáticos são caros de consertar, e este em especial é bem moderno e por isso deve ser mais caro.
Paulo Castro disse…
Opa, comprei esse bixo ai... hehehe recebo amanha...

2.0, preto, automatico, 09/09, FLEX. Saiu por 52.000,00

acho q pelo preço dá pra "suportar" os contras do texto...

Abraço.
Paulo Castro disse…
Opa, comprei esse bixo ai... hehehe recebo amanha...

2.0, preto, automatico, 09/09, FLEX. Saiu por 52.000,00

acho q pelo preço dá pra "suportar" os contras do texto...

Abraço.
Dubstyle disse…
Paulo, por esse preço eu cheguei a ver Bora manual. Automático, sempre acima dos R$ 57 mil. Excelente compra e parabéns pelo carro novo!
Dedebh disse…
O Paulo, conta pra gente aonde vc conseguiu esse preço?
Paulo Castro disse…
Longa história.

Em janeiro fui a concessionaria aproveitar uma promoção deles, onde o Bora 08/09 mec tava saindo por 47.000,00. Comprei, só que por causa de um escandalo de emplacamentos (coloca no google - Caso EUROMAR fraude locadoras ) passei 3 meses sem conseguir emplacar o carro, e sem previsão de fazê-lo. Dai propus na concessionaria um acordo extrajudicial, onde eu pagaria mais 5.000,00 e eles trocaria o meu carro por um novo, 09/09, flex e automatico.

Cumpriram o acordo na semana passada, depois de muitas reunioes com o departamento juridico da concessionaria (que nao queria cumprir a parte dela).

Recebi o carro dia 26/05.

Por isso sai só esse preço. Hj, nessa mesma concecionaria ele é vendido por 64.000,00

Abraço
Unknown disse…
Tenho uma proposta p/ o Bora por 55 mil, c/ o tipronic !! possuo um astra 2.0 2005, flex, c/ ar digital ( elegance )e o carro anda p/ caramba ! Pergunto : caso dquira o Bora vou me decepcionar com o desempenho??? Vale à pena pagar mais( digo, bemm mais ) e pegar um corolla XEI automático ????
Grande abraço,

Luciano Ortega de S. Carneiro .'.
ortegacarneiro@gmail.com
Unknown disse…
Tenho uma proposta p/ o Bora por 55 mil, c/ o tipronic !! possuo um astra 2.0 2005, flex, c/ ar digital ( elegance )e o carro anda p/ caramba ! Pergunto : caso dquira o Bora vou me decepcionar com o desempenho??? Vale à pena pagar mais( digo, bemm mais ) e pegar um corolla XEI automático ????
Grande abraço,

Luciano Ortega de S. Carneiro .'.
ortegacarneiro@gmail.com
Anônimo disse…
corrigindo o freio do Bora tem EBD sim.
Nildo de Paulo Afonso BA disse…
Tenho um BORA 08/09 com c/ cambio automatico e sou fissurado pelo carro, nunca vi ntanata suavidade nas trocas, no modo sequencial nem se fala. Tem outra, moro no interior do nordeste e não sei se e por isso mas por onde passo as pessoas olham con muita admiracão. Sei que o bicho impõe respeitopela beleza e elegância.
markin disse…
Ola eu gostei muito da ´´reportagem´´ e do seu blog! foi muito util pra mim, um abraço.
Anônimo disse…
Cara, bacana teu comentário, vc é um cara bem equilibrado e imparcial. isso tem faltado em repórteres do gênero !
Anônimo disse…
Meus parabéns pelo texto. é um belo desenvolvimento para ajudar os futuros compradores de um bora automático. muito bom!
Anônimo disse…
Estou para comprar um "Bora automatico 2010 flex" e me sinto muito mais seguro agora... Muito bom o texto!
Obrigado!

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