Falta vocação

O reflexo mais gritante das altas vendas de automóveis nos últimos dois anos não é nem o aumento nos congestionamentos. É o aumento desproporcional das pessoas que não sabem dirigir, mas se arriscam mesmo assim.

Segunda pela manhã eu percorri 25 km em São Paulo, num horário em que o trânsito já estava bom, 10h. Um Fiesta prata freou abruptamente por causa de um radar numa via cuja velocidade máxima permitida é de 90 km/h; a pessoa reduziu a velocidade para 60 km/h, na pista da extrema esquerda. Um Corolla preto trafegava lentamente ocupando metade da pista da esquerda e metade da pista ao lado (digamos, pistas um e dois) numa avenida de grande movimento, enquanto se preparava para entrar à esquerda. Foi assim ao menos por um quilômetro até a pessoa efetivamente fazer a conversão. E, por fim, um Monza azul que entrou numa via de tráfego rápido (90 km/h) sem se preocupar se vinha alguém na pista da direita (eu, no caso).

Esse foi um dia, um trajeto, um horário. Diariamente, os que dirigem bem são submetidos a todos os tipos de inépcia no volante, verdadeiras barbaridades cometidas por aqueles que simplesmente não têm o dom de dirigir.

Eu vejo o ato de conduzir como algo que tem um pouco de prática e um pouco de dom. Pessoas que têm o dom aprendem rápido e muitas se tornam pilotos profissionais. São pessoas que têm a noção exata do tamanho do carro, de sua capacidade de aceleração e frenagem, enfim. Vemos vários bons motoristas por aí, e não é questão aqui de enfatizar os que correm, mas os que trafegam na velocidade mais alta adequada às condições momentâneas de tráfego. Por mais que o cara seja piloto, costurar em alta velocidade no meio de um trânsito carregado é burrice, além de perigoso.

Existem, todavia, pessoas que não nasceram para dirigir. Todos nós temos vários tipos de inteligência no cérebro, e essas pessoas podem ser superdesenvolvidas no que diz respeito ao lado emocional, ou musical, ou que o valha, mas não conseguem dirigir. É normal. Eu também não consigo fazer várias coisas e nem por isso fico submetendo os outros à minha inaptidão. É como alguém que não sabe fazer um Miojo chamar os amigos para todo sábado comerem um jantar preparado por ele. Ninguém merece.

Por isso seria excelente se essas pessoas que não foram talhadas para dirigir – e, acredite, a maioria sabe disso, mas ignora o fato – usassem mais transporte público ou pegassem carona. A melhora na economia permitiu que cada vez mais gente comprasse um carro, e nesse bolo tem muitas, mas muitas pessoas que simplesmente colocam todos em risco ao saírem de casa.

Claro que alguns se tornam motoristas medianos após alguma prática – dirigir é, sobretudo, prática – mas muitos não têm jeito mesmo. Se tivéssemos um curso de reciclagem de motoristas, mas coisa de verdade, talvez pudéssemos reduzir a quantidade de perigos ambulantes que vemos por aí.

Enquanto isso não acontece, fica minha recomendação: dirija numa velocidade adequada, antecipe os movimentos dos outros e, principalmente, compre um carro que freie bem.

Comentários

Unknown disse…
Na verdade é pior do que você diz. Acho que cambio automático deveria ser item obrigatório, pois nem mudar as marchas as anatas sabem. Ficam 5 horas ao lado de um caminhão em quinta e não reduz para fazer logo a ultrapassagemm
Unknown disse…
Olha, concordo.
A questão é, por melhor piloto que qualquer um seja, uma corrida é uma coisa, porque quase tudo é previsível, tu sabes quando o outro vai frear, acelerar.

No transito não, a pessoa pode se confundir e dar uma freada forte por nada, é o suficiente pro melhor dos puilotos bater.
Ontem mesmo eu estava na br e uma menina em um uno estava sem as mãos no volante, olhando as pontas duplas dos seus cabelos! Me deixou de cabelo em pé!!

Mudando de assunto, que tal uma avaliação do Picanto??? Estou bem curioso em relação a esse carro!!

Abraços
André disse…
Texto brilhante!!!
Aqui em Brasília, talvez pelo poder aquisitivo da população e pela total ineficiência do transporte público, este mal já é percebido a muito tempo. Desde que cheguei aqui, fico impressionado com as barbaridades cometidas no trânsito, bem como os acidentes absurdos nos locais mais improváveis que presencio.
Dubstyle disse…
Rafael, ultrapassagem em pista dupla é uma das coisas mais difíceis de se fazer como motorista, e perigosa. Sem dúvida muita gente não sabe fazer, mas falo de coisas ainda mais básicas, como entrar numa via preferencial. O pessoal é muito braço duro.

Conrado, sei de uma amiga que faz a maquiagem todo dia no caminho do trabalho, usando o espelho do para-sol do carro. Pior ainda... Sobre o Picanto, gosto muito do carrinho e ele está na lista de futuros testes sim.

André, ouvi dizer também que em Brasília o pessoal é mais desleixado ao volante pois as retas são muito longas e as velocidades muito baixas. Isso pode contribuir...
Anônimo disse…
Eu acho que os exames de motorista se prendem a coisas ridiculas. O cara ta preocupado se tu contorna a curva colado na direita (sendo que ninguem na mesma rua faz isso, e nem é necessário). Acho que o exame deveria cobrir situações de frenagem, estrada etc.. nao uma voltinha no bairro.

e vai da cabeça de cada um também, eu já tenho mais de 3 anos de carga e a ultima vez que dirigi foi no exame. Sei que sou péssimo, e nao devo fica limando carro de ninguem. Um dia quando tiver dinheiro eu compro um velhinho e vou aprender com calma, num lugar tranquilo antes de fazer cagada no transito
Anônimo disse…
O artigo é excelente e veio na hora certa. O problema é que todo mundo se acha o melhor piloto que existe. O errado é sempre o outro. Dirigir é antes de tudo ter educação.

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