Hexa. E daí?
Certa vez, uns dois anos após a morte de Ayrton Senna, me perguntaram quem havia sido o maior piloto de Fórmula 1 de todos os tempos. Sabia que ia causar polêmica, mas naquela época tinha a firme convicção que havia sido o argentino Juan Manuel Fangio.

No entanto, não o prezava apenas pelos cinco títulos mundiais. Eles eram, na verdade, a prova de seu talento. Me impressionavam muito mais suas histórias, como sair de uma corrida com queimaduras nas pernas em virtude da falta de refrigeração do motor, ou usar uma árvore como referência para fazer uma curva traiçoeira no velho circuito de Nürburgring (aquele com 27 km de extensão e apenas 7 voltas). Além disso, não era europeu, o que sempre causava dificuldades, e venceu seguidas vezes diante de um excelente piloto inglês, Stirling Moss. Os carros da década de 50, conhecidos como “charutinhos”, eram precários e, embora alcançassem altas velocidades (acima de 250 km/h), sua estabilidade era ruim e não possuíam nenhum tipo de auxílio eletrônico.

Muito mais que seus títulos mundiais, são histórias como essas que contribuem para a fama e credibilidade de um piloto. Nelson Piquet colecionou várias, mas seu estilo pragmático de pilotagem e sua índole difícil o tornaram pouco carismático.
É assim que Ayrton Senna ombreia Fangio no panteão dos maiores pilotos de F1 de todos os tempos. Discutir quem é melhor é difícil; não são da mesma época. Mas Senna coleciona histórias tão ou mais interessantes do que as do argentino. Como vencer o GP do Brasil utilizando apenas uma marcha, e seu emocionante gesto de festejar com a bandeira do Brasil a cada vitória. Além disso, para nós, brasileiros, ver o sucesso de um conterrâneo que passou pelas mesmas dificuldades, e que viveu nesta mesma cidade, passou pelas mesmas avenidas, tem um apelo especial.

Lembro da temporada de 1992. É possível defini-la em uma cena: a Williams FW12, com as rodas apoiadas em cavaletes, subia e descia de acordo com a vontade dos computadores. A suspensão ativa revolucionaria o circuito até sua proibição. Perto da Williams, a outrora vencedora McLaren parecia um Fusca. E lá vinha um maluco, fazendo as curvas de lado, com duas rodas na zebra e as outras duas na grama, buscar aqueles robôs motorizados. Era Ayrton Senna, “a maneira mais segura de se tirar um segundo a cada volta”, como cansou de afirmar Ron Dennis, seu chefe na McLaren.

Portanto, os seis títulos mundiais de Michael Schumacher não me dizem nada. Poderia ganhar doze vezes que continuariam a não me dizer nada. Ele não coleciona histórias de coragem e heroísmo, apenas sandices como os choques com Damon Hill e Jacques Villeneuve nas últimas temporadas da década de 90. Até a outrota emotiva equipe Ferrari tornou-se uma máquina azeitada e desinteressante. Hoje a F1 está chata e burocrática, com pilotos lutando pela regularidade. Mesmo Montoya, que parecia colocar fogo no circo, foi domesticado. Até Alain Prost, que todos os brasileiros têm atravessado na garganta, tem mais histórias do que Schumacher. Muito se diz da falta de rivais à altura do alemão. Não estou certo. Não acho que Jacques Villeneuve, Damon Hill e, principalmente, Kimi Raikkonen, Mika Hakkinen e Juan Pablo Montoya sejam pilotos fracos. O que o alemão não tem é bagagem histórica.

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