Teste: Chevrolet S10 Colina Cabine Dupla Turbodiesel
Esta ineficácia governamental se traduz, em termos de transporte, num país com a maior parte de sua malha rodoviária composta por estradas de terra, ou chão. Isso quando há estradas para se chegar a um determinado local, e não transporte exclusivamente por barcos ou no lombo de mulas.
Se pensarmos friamente nessa realidade, o Brasil está mais próximo de países africanos do que da Europa ou dos Estados Unidos. E quais são os carros que vemos na maior parte das imagens referentes à África? Jipes, utilitários, SUVs de todas as épocas.
E é esta parte congolesa do Brasil que ainda compra a veterana GM S10, disponível por aqui há longos 16 anos. Comprar uma S10 ou Blazer para rodar majoritariamente na cidade, ou em boas estradas, é de uma estupidez sem tamanho. Colocá-las para enfrentar os lamaçais e buraqueiras que compõem boa parte de nossas estradas já começa a fazer sentido. E este teste foi muito privilegiado por ter submetido a S10 a estes dois ambientes: verdadeiras pirambeiras de terra e também caminhos recém-asfaltados que remetiam a encrencas como Ferraris e Aston Martins.
Seremos breves nos comentários de estilo, para não ofender ainda mais os olhos de nossos leitores. A S10 é uma aberração, filhote de cruz credo, um dos automóveis mais hediondos a circular pelo Brasil. A versão original, de 95, era talvez a mais bela picape de sua época, sendo sucessivamente enfeiada pela remodelação nos faróis dianteiros e depois com a adição de diversas molduras plásticas completamente inadequadas. As lanternas traseiras já passaram por todas as micro transformações possíveis: foram todas vermelhas, depois cresceram, ganharam centro branco, e agora as luzes de ré e do pisca são protuberantes. Por dentro, o clima é o mesmo de quase duas décadas atrás. A versão avaliada, Colina, é a de entrada e não possui luxo algum. O revestimento das portas e do painel é de plástico duro, sem espaço para tecidos. Não há nenhum cromado ou algo que o valha para tentar dar requinte ao modelo, com exceção das maçanetas internas. Mesmo os botões de acionamento das luzes e da ventilação são suaves demais e parecem que vão quebrar, embora o restante do interior seja bem sólido e resistente. O tecido é pobre e áspero, mas está num nível acima do que vemos nos carros compactos de entrada. O painel redesenhado com a iluminação “Ice Blue” faz boa figura.
O motorista precisa se virar com regulagens somente de altura do volante e de distância do banco – mas, como a maioria dos automóveis da GM, há um bom espaço até os pedais, o que ajuda os mais altos. Atrás, o espaço é bom em largura, mas crítico em altura e para as pernas, como é até comum em picapes de cabine dupla. Sem dúvida não é um lugar confortável para viagens longas.
A origem antiga deixa a S10 com cara e jeitão de picape, o que é apreciado por muitos. Aqui reside uma das características que fazem a fama de solidez do modelo, da mesma maneira que ocorre com o Gol G4: por possuir comandos duros e difícies, o veículo transmite uma sensação de solidez que pode não ser verdadeira. Para fechar as portas da S10, é preciso batê-las com veemência; todas as marchas precisam de um esforço extra para serem engatadas, especialmente a primeira. As manivelas dos vidros são duras e difíceis de acionar. E seguem anacronismos, como o freio de mão acionado por pedais.
O motor a diesel é relativamente moderno, um 4 cilindros longitudinal com três válvulas por cilindro, 2.8 litros e turbo com intercooler, para um nível adequado de potência (140 cv a 3500 rpm) e soberbo de torque, 34,7 m.kgf entre 1800 e 2400 rpm. Ao contrário dos motores europeus (como o utilizado na BMW 118d, testada pelo M4R), este não faz muita questão de ser refinado: o tec-tec-tec característico da marcha lenta é bem audível, e o ronco ao acelerar é ouvido por todos ao redor.
Some-se este motor aos anacronismos já citados e o que se tem é um veículo mais próximo de dirigir um caminhão do que um automóvel. A relação de marchas, como não poderia deixar de ser numa picape, privilegia a força – são quatro velocidades muito curtas e uma quinta bem longa. Em ultrapassagens, o uso da quarta marcha para se obter mais força do motor é limitado, tanto pela relação curta como pelo fato do motor perder fôlego a partir de 3500 giros (a faixa vermelha começa em 4 mil). O próprio motor diesel impõe uma outra dirigibilidade, uma de troca muito cedo das marchas, tanto pelo barulho quanto pelo amplo torque disponível em baixos giros. A suspensão macia, os freios com baixa sensibilidade e a direção muito leve só contribuem para uma sensação diferente ao dirigir, como já mencionamos ao guiar uma Blazer.
O câmbio é duro e requer uma certa força, mas é surpreendentemente gostoso de operar nesse “modo picape”. Já o volante tem uma assistência até excessiva, que assusta em altas velocidades. O carro como um todo não foi feito para isso: mudanças de faixa acima de 100 km/h precisam ser planejadas, pois deslocar aquela massa toda, mal distribuída (tudo no eixo dianteiro), com um volante leve e pouco comunicativo, é até arriscado.
A suspensão segue um conceito antigo, com feixes de mola atrás, e possui uma calibragem típica de picape: mole na frente e dura na traseira, para carregar peso. Vazia, a caçamba saltita, embora não tanto quanto a cabine simples. Os freios existem, mas não gostam de ser incomodados: é só com muita força no pedal que eles começam a exercer uma vaga influência na redução da velocidade.
Por este caminhão disfarçado de picape, a GM pede R$ 91.666 reais, como o modelo testado, com pintura metálica e ar-condicionado. Os equipamentos são mínimos: vidros a manivela, travas manuais e air-bags nem de longe.
É desnecessário dizer o quanto isso não vale a pena. Com essa quantidade de dinheiro é possível comprar carros realmente bons, como um Fusion. Mas quem compra um Fusion não compra uma S10. Quem compra um ix35, que sai pelo mesmo valor, também não compra uma S10. Quem compra uma S10 turbodiesel é quem vive na zona rural, com estradas péssimas, lama, diesel mais barato que o álcool e a necessidade de rodar por muitos quilômetros sem ver um posto de gasolina (a autonomia da S10 pode chegar a mil quilômetros com um tanque). E quem tem essas necessidades não está lá muito preocupado se a picape é bonita, se o acabamento é de primeira linha, e sim quer comprar um cavalo de força que entregue robustez para vencer os piores caminhos. E, claro, que só exista uma concessionária da Chevrolet nas cidades próximas.
Pois, se o comprador puder optar por uma Hilux ou mesmo uma Ranger, deve fazer sem dó. Elas são bem melhores.
Estilo 0 – Aqui foi quase a primeira nota negativa da história do M4R. Como essa S10 ficou feia.
Imagem – S10, ainda mais a diesel, mostra que o motorista não está ali brincando. É um carro masculino, acima dos 40 anos, de preferência com chapéu e uma baita fivela no cinto.
Acabamento 2 – O tecido do banco não é dos piores. De resto, só plástico. Bem-encaixado, no entanto.
Posição de dirigir 5 – Não existem muitos ajustes, e a posição de dirigir destas picapes é naturalmente diferente da de um automóvel. Isto posto, é boa a distância até os pedais e o volante tem boa pega.
Instrumentos 7 – Painel bonito, com os quatro mostradores básicos que varrem a área ao ligar a ignição. Podia ter computador de bordo.
Itens de conveniência 1 – De série, só direção hidráulica e ABS nas quatro rodas. Custa o preço de quatro Gols G4 e tem o mesmo nível de equipamentos.
Espaço interno 5 – É bom na frente e pequeno atrás para pernas e cabeças. O carro é maior por fora do que por dentro, mal de projeto antigo. E a ausência de porta-objetos é quase total.
Porta-malas 8 – A caçamba de 860 litros está na média da categoria para uma picape cabine dupla.
Motor 9 – Para um diesel, as vibrações são contidas e a entrega de potência e principalmente torque é imediata. Sobe de giros com surpreendente facilidade. Mas é barulhento.
Desempenho 6 – Acelera de 0 a 100 km/h em quase 14s e a máxima é de 173 km/h. Os números não são bons, mas a impressão a 100 km/h é a de se estar a 400.
Câmbio 4 – Alavanca enorme e engates duros, porém precisos. Está alinhada com a proposta “quero ser um caminhão”.
Freios 0 – A impressão de que aquele mamute não vai parar é real – ele não para mesmo. É assustador.
Suspensão 5 – O conceito antigo é até valido numa picape, ainda mais na S10, que se presta a uso severo. A calibração é complicada; podia chegar num meio termo entre esse jeitão picape e uma condução mais civilizada.
Estabilidade 0 – Mudar de faixa em alta velocidade requer planejamento e nervos de aço. Não chega a dar medo de tombar, mas parece que vai derrapar e sair da pista.
Segurança passiva 1 – O vidro está perto demais da cara do motorista, e é esse vidro que fará as vezes de airbag. Ao menos o airbag é de série nas versões Rodeio e Executive.
Custo-benefício 0 – O único motivo para alguém comprar uma S10 cabine dupla turbodiesel é não existir uma concessionária de outra marca num raio de 500 km. Hilux (mesmo R$ 10 mil mais cara), Frontier, Amarok, Ranger: vá de alguma outra.
(fotos da versão Executive)
Comentários
Concordo com algumas coisas... Mas tem algo que você goste?
Luciano
http://4rodas.blogspot.com/2010/11/teste-audi-r8-52-spyder.html
:-)
Espero que outros compradores, na dúvida como eu, pesquisem na "net" antes de fazer um investimento tão alto num produto de tecnologia, hoje, bastante limitada...
Valeu mesmo.
ERS.
Espero que outros compradores, na dúvida como eu, pesquisem na "net" antes de fazer um investimento tão alto num produto de tecnologia, hoje, bastante limitada...
Valeu mesmo.
ERS.
Salutos
By_popi