Renegando a história

Imagem é um negócio muito forte. Vejam o post do Flavio Gomes, super jornalista do setor automobilístico e fã de carros antigos:

Meus amigos doistempistas da Europa já colocaram um videozinho do 37º encontro anual do Auto Union Veteranen, que em 2010 aconteceu na Holanda. Mais de 200 carros e motos, é uma maravilha indescritível. Estive num desses dois anos atrás. E vejam o F12 a 130 km/h! É fraco, o cara? Ah, é bom lembrar que a Audi, lá, participa ativamente do encontro. Aqui, em 2008, se não me engano, consegui algum apoio da Audi do Brasil para nosso encontro de Caxambu, o Blue Cloud. Mas desconfio que nunca mais. Pelo que tenho visto, as prioridades da marca no Brasil são outras. A estratégia inclui aparições frequentes em “Caras”, jogos de pólo, feiras de iates e colunas sociais eletrônicas. Um verdadeiro pé-no-saco, querendo transformar qualquer Audi em carro de mauricinho e patricinha. Por isso não vende nada.

Qualquer marqueteiro tem na ponta da língua a explicação para a postura da Audi. É uma marca de luxo, que deseja competir com BMW e Mercedes, e cujo público-alvo está justamente lendo Caras, jogando polo, andando de iate, tudo isso. A estratégia faz todo o sentido do ponto de vista de posicionamento, traz vendas, enfim, não há o que discutir. Já na Europa, que o pessoal leva o antigomobilismo a sério e que você não precisa ser rico para ter um Audi, a coisa muda de figura.

O que mostra como é difícil você puxar a imagem de uma marca fora de seu território. A GM tinha oito milhões de marcas justamente para contar com um nome de peso em cada segmento, como Chevrolet para os baratos, GMC para as picapes, Cadillac para os luxuosos.

A coisa fica ainda mais interessante ao analisarmos o comportamento da indústria em países diferentes. O Civic vem no Brasil com toda essa banca de luxo, carrão e tal, e nos EUA seu posicionamento como carro jovem e de entrada muda a coisa totalmente de figura. Assim como existe nos mercados latinos um Jetta com câmbio e ar manual, lanternas traseiras comuns, sem moldura cromada na janela, comportando-se como o carro que realmente é: o sedã do Golf.

Voltando ao caso da Audi, um dos problemas de você ficar empurrando carros horríveis goela abaixo do consumidor é que isso destrói o seu lado histórico. Imagino uma visita hipotética a um museu da GM nos EUA: vários carros até a década de 70, verdadeiros ícones automotivos, e de repente uma lacuna enorme, refletindo o monte de bobagens que foram produzidas naquele país até os anos 2000. Imagine esse museu GM no Brasil, cheio de Celtas, Classics chineses, Astra com 10 anos de produção. Credo.

A mesma coisa faz a Audi, apagando seu passado Auto Union e DKW – aliás, apagando, não; colhendo os frutos gloriosos, como os carros que quebravam recordes de velocidade nos anos 30, e apagando os DKWs que não interessam – para manter seu posicionamento de marca de luxo. Mesmo a Mercedes e a BMW tiveram seus momentos mais acessíveis nos anos 50, e nem por isso ficam apagando o que fizeram.

O que é muito bom para a mentalidade europeia, e não para os brasileiros fúteis que olham um DKW e pensam “que carro velho”. Infelizmente, parece que os compradores de Audis pensam assim, ao invés de terem orgulho deste passado da marca e, principalmente, de seu histórico desbravador nos Brasil dos anos 60.

Falta cultura, muita cultura.

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