Teste: Honda City EXL
Fala-se muito na rivalidade entre
Civic e Corolla, carros que há anos disputam ferrenhamente o mesmo segmento e o
mesmo tipo de consumidor.
Está certo em se falar de rivalidade,
e a frase acima estava correta até a geração que conhecemos como New Civic em
2007. Pois a partir de então os japoneses continuaram disputando o mesmo
segmento, mas com perfis de consumidor bastante diferentes.
Originalmente este Civic vinha com
suspensão multilink, comportamento nitidamente esportivo e um porta-malas
risível. Definitivamente fora do que se convencionou chamar de sedã familiar.
Muita gente comprou assim mesmo, uns por não precisarem desses atributos,
outros simplesmente fizeram malas menores ou levaram menos gente.
Fato é que estas características
dessa geração do Civic, aliados à comodidade de já oferecer o produto em outros
países, a partir da plataforma do Fit, levaram a Honda a iniciar a produção
brasileira do City. E, considerando o aspecto “carro de família”, o rival do
Corolla na Honda é o City.
Hoje o Civic ganhou um aumento de
porta-malas que obviamente voltou a credenciá-lo como carro de família neste
aspecto. Ainda assim, o City é maior em espaço atrás e em porta-malas.
O City também tem outra
característica desde seu lançamento que o aproxima do Corolla. É a completa
indiferença ao ato de dirigir. Ao contrário do Civic, que tem um quê de
entusiasta, o City é realmente para levar de A para B. Aqui até faríamos uma
exceção ao City manual, mas dado que ele é praticamente inexistente, achamos
que nem precisa.
Se você for racional até o último fio
de cabelo, verá que o City é uma melhor compra do que Civic e Corolla. Pois
leva passageiros com conforto e espaço muito parecidos (um pouco prejudicado na
largura menor), possui o essencial em equipamentos e é mais barato de comprar e
de manter. Civic e Corolla possuem mais status e desempenho, mas aí já estamos
saindo do campo da racionalidade.
O design do City talvez seja a única
característica mais emocional, pois juntamente com o Fit representa o mais
ousado da tendência atual da Honda de encher seus carros de vincos e relevos. O
vinco sob as maçanetas é por exemplo um dos mais destacados que já vimos. A
frente também abusa com uma larga faixa cromada – melhor ao vivo do que em
fotos – e o melhor ângulo do carro em nossa opinião é mesmo a traseira, com
lanternas inspiradas na antiga BMW série 3 que fazem o carro parecer mais
largo. A Honda também ousou nas rodas diamantadas de série em toda a linha, de
desenho inspirado, porém mesmo com aro 16 ainda parecem pequenas.
Por dentro temos uma considerável
evolução em relação à geração anterior; no entanto, a origem no Fit fica clara
com o mar de plástico preto e duro que reveste portas e painel. Os designers
conseguem atenuar esta impressão com uma parte grande do painel em black piano
e também uma faixa metalizada ligando as saídas de ar, de bom gosto. Também
foram bem-sucedidos no desenho do ar-condicionado “touch screen”, que quando
desligado fica integrado ao painel (porém não é prático de usar em pisos
irregulares, pois requer toques precisos nos botões), e do cluster, com os
mostradores agrupados em três círculos iluminados em azul. O conta-giros à
esquerda poderia ser maior, e à direita o mostrador de combustível é digital
acompanhado por um medidor de consumo instantâneo e computador de bordo com
autonomia, duas medições de consumo médio e temperatura externa. O medidor de
temperatura do líquido de arrefecimento foi substituído por luzes-espia, como
no anterior. O velocímetro é ladeado por luzes azuis, que se tornam verdes na
condução econômica.
No centro do painel em black piano
está o mostrador multimídia. No M4R não dedicamos muito tempo a eles pois
preferimos as sensações ao dirigir, porém em alguns casos é importante
mencioná-los. Como no caso do Focus Mk3, por exemplo, que tem uma central
sensacional. Ou no do City, que tem uma trapizonga horrível.
O sistema integra leitor de CD,
Bluetooth, USB, rádio e câmera de ré. Só que faltou mais cuidado com a
aparência das coisas. Claro que tudo funciona bem – é um Honda -, mas a tela em
tons azuis tem uma aparência de sistema chinês que dá desgosto. As telas são
feias, sem inspiração, com um desenho horroroso, e ainda por cima a tela de 5
polegadas fica perdida num cluster enorme, que facilmente comportaria uma tela
de 7 polegadas ou até mais. Para o modelo 2016 a versão de topo EXL vai ganhar
um sistema melhor, mas as outras continuarão com essa feiúra.
Os bancos têm ampla acomodação (os
Honda de forma geral são muito bons em bancos) e a posição de dirigir é boa,
com ajuste de altura e profundidade do volante e do banco. Não há regulagem
lombar, mas não faz falta. Os comandos estão sempre à mão e o volante integra
teclas do sistema de som e do piloto automático. A versão testada EXL traz
revestimento em couro de série nos bancos, de ótima qualidade, e no volante,
que nos decepcionou por ser muito duro. A direção é elétrica e bem calibrada.
Os equipamentos, como é padrão na
Honda, cobrem o básico sem oferecer nenhum mimo adicional. Estão presentes o ar
digital “touch screen”, direção elétrica, trio elétrico, sistema de som
completo com câmera de ré, air bags frontais e laterais, ABS, chave canivete, e
pouco além disso. Itens como rebatimento elétrico dos retrovisores, retrovisor
interno fotocrômico, sensor de luz e chuva e principalmente sensor de
estacionamento estão ausentes.
Assim como no Fit, do qual deriva, o
City surpreende no espaço interno. Parte disso se deve à boa engenharia da
plataforma, e parte se deve a um truque da Honda que é limitar o ajuste
longitudinal dos bancos dianteiros. Pessoas mais altas, acima de 1,85m, ficam
com as pernas apertadas nos bancos da frente mesmo na regulagem mais distante.
Em compensação, isso mantém sempre um ajuste cavernoso para as pernas dos
passageiros de trás. Chega a ser maior que o espaço do Civic e similar ao do
Corolla – que melhorou muito na atual geração. O porta-malas é cavernoso, com
536 litros de capacidade e boa abertura da tampa.
O motor é o mesmo 1,5 16v que sempre
equipou o modelo, com algumas melhorias para produzir 116 cv a 6 mil rpm e 15,3
m.kgf de torque a 4.800 rpm, acoplados a um câmbio CVT com conversor de torque
num modelo de modestos 1.137 kg. Em termos de desempenho o resultado é bastante
satisfatório, com o City pulando pra frente nas saídas de semáforos e retomando
velocidade com rapidez. O câmbio CVT é um forte aliado nessas horas, pois é
muito rápido em elevar os giros do motor reduzindo a relação, para mais
potência. E também contribui com a economia, pois na condução normal
dificilmente passa de 2 mil rpm – a 120 km/h está a 2.150 rpm. O resultado são
números assombrosos de consumo, como 10 km/l de gasolina na cidade. Os altos giros da
potência e torque pouco se notam na condução normal, com a sensação de força
suficiente todo o tempo.
A nota negativa é a mesma de todo
CVT, a sensação de carro elétrico ou de carro de brinquedo. É de fato estranho,
especialmente para quem está acostumado com outros câmbios automáticos. A
aceleração não vem acompanhada das trocas de marcha e redução de giros do
motor, o que passa a sensação de lerdeza; é preciso checar o velocímetro com
frequência para averiguar que se está trafegando à velocidade desejada. A Honda
tentou atenuar esta sensação dotando o City de borboletas para trocas de marcha
atrás do volante, que fazem tanto sentido quanto comer feijoada estando de de
regime. Seu funcionamento é dos melhores que já vimos em CVTs, simulando trocas
de marcha com rapidez e precisão. Com o câmbio em D o retorno ao modo
automático é feito em poucos segundos; já com o câmbio em S o modo só se
desativa pressionando a alavanca da direita. Usar as aletas é mais para
diversão do motorista do que qualquer outra coisa; o carro acelera e se
comporta melhor com o câmbio em D.
A suspensão de conceitos tradicionais
foi talvez a melhor surpresa que tivemos ao testar o carro. Temos memórias
vívidas da dureza excessiva do Fit, que inclusive apelidamos de “cabrito”,
tamanho o pula-pula que promove com sua suspensão excessivamente dura em pisos
irregulares. O City não é macio, mas consegue um compromisso muito melhor.
Parte se deve ao maior peso na traseira, combinado ao fato de as caixas de
rodas posteriores não estarem parcialmente dentro do habitáculo. Parte talvez
se deva a uma nova calibração adotada pela Honda. A verdade é que ficamos
surpresos com a placidez do City no asfalto castigado, sendo talvez o melhor de
todos os Hondas nacionais neste aspecto.
Por outro lado, os freios confirmaram
a péssima expectativa que tínhamos deles. Nesta geração a Honda adotou tambores
nas rodas traseiras em todas as versões, um retrocesso diante dos discos usados
pelas gerações anteriores. Pode-se debater o quanto discos na traseira são
necessários num carro de peso e desempenho modestos; no entanto, o que estraga
de vez a sensação para nós é a sensação do pedal, morta no início de curso e
com potência de frenagem somente com o pé lá no assoalho. Dá a impressão que
não vai frear e por várias vezes freamos mais perto do carro da frente do que
gostaríamos pois esperamos uma resposta dos freios no início da frenagem e ela
simplesmente não vem. O item piorou mesmo, como mostra o teste da Quatro Rodas:
As frenagens pioraram em todas as passagens. De 120 km/h até a parada total, precisamos de 67,7 metros, espaço 16,7% maior em relação ao City 2010. Partindo de 80 km/h, a piora foi de 13,3%, com 28,3 metros. E, freando forte a 60 km/h, foram 16,4 metros até a imobilidade, ante 13,9 na geração passada. Ainda que não seja possível culpar apenas um fator, o fato é que o City EXL tinha freio a disco nas quatro rodas. Agora todas as versões usam tambor no eixo traseiro.
As frenagens pioraram em todas as passagens. De 120 km/h até a parada total, precisamos de 67,7 metros, espaço 16,7% maior em relação ao City 2010. Partindo de 80 km/h, a piora foi de 13,3%, com 28,3 metros. E, freando forte a 60 km/h, foram 16,4 metros até a imobilidade, ante 13,9 na geração passada. Ainda que não seja possível culpar apenas um fator, o fato é que o City EXL tinha freio a disco nas quatro rodas. Agora todas as versões usam tambor no eixo traseiro.
Chama a atenção ainda as medidas
modestas de pneus (185/55 R16), que são mais do que suficientes para o acerto
dinâmico do carro e são mais baratos na reposição que os tamanhos abusivos
empregados por muitos carros por aí.
Finalizado nosso convívio com o City,
chama a atenção a racionalidade com que o carro se apresenta. Baixo consumo,
baixo custo de seguro e manutenção, espaço interno suficiente, porta-malas bom,
desempenho adequado, ele tira boas ou ótimas notas em todos os itens presentes
na lista do comprador racional de um sedã. É muito difícil ou quase impossível
justificar racionalmente a compra de qualquer sedã compacto ou médio diante do
City.
Assim como é muito difícil ou quase
impossível justificar uma bela picanha diante de um ultra-saudável prato de
soja com batata doce. Ainda bem que racionalidade não é obrigatória.
Estilo
6 – Um tanto polêmico, peca no excesso de vincos e cortes que o envelhecerá
muito rápido. A traseira ficou elegante.
Imagem
– “O carro para quem está indo bem”. E leva a família.
Acabamento
7 – O couro original é ótimo, assim como os encaixes e vãos entre peças. Os
plásticos precisam melhorar.
Posição
de dirigir 9 – Ergonômico, com bons ajustes e comandos ao alcance das mãos.
Instrumentos
9 – Preferimos marcadores a luzes-espia para temperatura; e o computador de
bordo poderia ter mais funções. Mas o layout ficou muito bonito.
Itens
de conveniência 6 – Tem o básico da categoria, o ar digital tem seu charme, mas
faltam mimos. E a ausência do sensor de estacionamento só pode ser justificada
com o objetivo de dar lucro aos concessionários.
Espaço
interno 9 – Muito bom, melhor que o porte do carro sugere.
Porta-malas
10 – Muito amplo, totalmente revestido, com boa abertura da tampa.
Motor
10 – Concilia números de potência adequados à cilindrada e proposta, sendo ao
mesmo tempo bem frugal no consumo de combustível. Só que não tem nada que apele
ao entusiasta, o ronco é feio e explorar altos giros só com as trocas manuais.
Desempenho
8 – Adequado, 0 a 100 em 11 segundos. Não passa sensação de lerdeza no uso
diário.
Câmbio
10 – É um excelente CVT, robusto, com conversor de torque para saídas e
respostas rápidas, e agilidade nas trocas manuais. Só que ainda é um CVT.
Freios
1 – A perda dos discos traseiros e a sensação de ausência de capacidade de
frenagem transmitida pelo pedal são problemas sérios.
Suspensão
9 – Conceito tradicional e um resultado surpreendente, um carro maduro e sereno
em piso irregular.
Estabilidade
7 – Não é um carro para se abusar andando rápido, com grande subesterço, mas
adequado para a proposta.
Segurança
passiva 9 – Somente o EXL tem os air bags laterais; isso vai mudar na linha
2016.
Custo-benefício
8 – É um item racional, não é? Então o City vai muito bem.
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