Fiat Palio Adventure Locker
Há uns bons anos, fui convidado a uma festa de aniversário a ser realizada no interior de São Paulo. Gente endinheirada. Fui alertado para tomar cuidado nos longos 20 km de estrada de terra, pois ela poderia estar ruim em alguns lugares. Imbuído com o melhor espírito “espero não atolar”, lá fui eu. A estrada de terra estava mais lisa que a parte de asfalto. Sério. O dono de uma Ferrari não precisaria se preocupar. Pra pegar justamente aquela estrada impecável que o prioprietário do sítio possuía uma Pajero.
E não é só ele. Meu carro era provavelmente o único humilde 4x2 tração dianteira presente à festa. O gramado usado como estacionamento era um festival de Land Rovers, Pajeros, Cherokees, Frontiers, Pathfinders e até mesmo mais humildes Ranger, S10 e Blazer. Aposto que seus donos não saberiam ligar a tração integral nem se ela ficasse no lugar do volante.
O que leva, então, à compra desses jipões? A sensação de segurança de um carro grande e alto, a robustez da suspensão em nosso asfalto reconhecidamente ruim, o espaço interno. No caso das alternativas a quem não pode dispor de mais de cem mil reais num jipão desses, ou seja, família Adventure e EcoSport, o que temos é um misto de jovialidade desses carros, mais a altura em relação ao solo e uma suspensão mais robusta.
Hm. Jovialidade é relativo, pois diversos outros carros também não parecem de tiozão. O próprio Civic rejuvenesceu nesta geração, ainda mais se comparado ao Corolla atual. Posição elevada de guiar é um fato: os carros aventureiros são mais altos, em especial Palio Weekend e EcoSport, ainda que para isso o comportamento no asfalto e em curvas seja comprometido. Por fim, a robustez da suspensão.
Em 1984 a VW decidiu colocar o Gol para disputar o campeonato brasileiro de rali de velocidade. A suspensão então deveria ser totalmente trocada, certo? Não: apenas reforço nos pontos de solda. E foi assim, praticamente original, que um dos Gols competiu por cinco anos.
A verdade é que a maioria das montadoras já considera o piso hediondo das ruas e estradas brasileiras ao projetar a suspensão de um carro no País. Exceção feita à Peugeot e seus problemas crônicos na área, em especial com o 206. Então optar por uma Palio Weekend Adventure ao invés de um Stilo, para ficar na Fiat, por medo de buracos é uma bobagem. Isso é ainda mais evidente se considerarmos Golf, Focus e Astra na equação, todos ainda mais robustos que o Stilo.
Se você é um daqueles que realmente encara terrenos difíceis, com os 53 mil reais pedidos na Weekend você pode comprar tanto S10 quanto Ranger, opções bem mais adequadas. O preço deixou esta versão injustificável, pois as picapes médias têm bem mais aptidão na terra, e outros carros são melhores no asfalto. Se os carros flex não são bons nem com gasolina e nem com álcool, a Palio Adventure não é boa na terra e nem no asfalto. Ela, no entanto, é melhor na terra do que um carro urbano, e melhor no asfalto do que uma picape. É difícil mensurar se a necessidade do comprador não poderia ser atendida por um carro normal.
Ao menos a Fiat deu um passo na direção certa ao introduizr o diferencial blocante, que impede uma roda de girar em falso ao perder a tração. Com isso, o carro ganhou uma aptidão melhor para o fora de estrada, juntamente com a maior altura do solo. Continua não sendo uma picape, mas agora tem alguma justificativa a mais para se diferenciar de um carro urbano comum.
Para sorte da Fiat, a Palio Weekend segue como um dos melhores produtos de seu portfólio, como falei há pouco. Bom espaço interno, acabamento condizente com a categoria, gostosa de dirigir, porta-malas bastante amplo. O motor 1.8 GM chegou a um estágio de desenvolvimento muito bom: tem um torque divertido já em baixíssima rotação, sem ser ruidoso ou vibrar demais. Não é girador, mas muito agradável na maioria das situações de uso. Dinamicamente a Palio Weekend Adventure é muito frágil, pois é ruim de curvas (suspensão mole, que permite muita rolagem da carroceria), ruim de frenagem, com freios subdimensionados, e ainda por cima pouca aderência no asfalto pelo uso de pneus mistos. O uso na cidade precisa ser cauteloso, embora isso não tenha nada de anormal.
O visual é que ficou estranho. A S10 2009 mostrou que o excesso de apliques plásticos pode matar o carro, e a Palio Weekend Adventure Locker chegou ao mesmo patamar. O carro é over, cheio de partes plásticas pretas, um peso desnecessário que não acrescenta nada nem à capacidade off-road e nem esteticamente. A frente e traseira importadas do Siena caem muito bem em carros elegantes e urbanos; a linha Adventure requer peças mais rústicas. Repare como o retrovisor vindo da Idea, cheio de arestas, fica em total contraste com os faróis dianteiros e traseiros, super elegantes. Design é uma questão de gosto; com certeza não é o meu.
O preço pedido pelo carro, no entanto, é abusivo. 53 mil reais permitem a compra de um Focus 2.0, se o seu negócio é desempenho e comportamento; um 307 1.6 ou um Polo, se a sua praia é equipamentos; ou um Punto Sporting, se o que você curte mesmo é design. E se você gosta dessa idéia aventureira, que tal uma Ranger Sport bem mais potente, com tração traseira, por 50 mil? Ou ainda a própria S10, com aquele visual horrendo, mas o confiável 2.4 flex GM e 140 cv?
Estilo 3 – Questão muito pessoal. A meu entender, a dianteira e traseira classudas destoam completamente do miolo “adventure”. O friso lateral acima das maçanetas também é over.
Imagem – Sem dúvida jovem, e mais masculino do que feminino. Em termos de imagem, a Fiat acertou em cheio com essa versão, desde o começo. Particularmente, eu prefiro atingir esse público com uma peruinha esportiva, suspensão mais dura e motor mais bravo, do que com versão aventureira. Mais Weekend Sport e menos Adventure. Mas há gosto pra tudo...
Acabamento 7 – Sempre foi o forte da linha Palio em relação à concorrência. Problema é equipar tanto um Palio ELX 1.0, de 30 mil reais, quanto a Locker, de 53, com o mesmo interior, e poucas mudanças. Depende da comparação: a Palio é competitiva nesse quesito em relação a Parati e 206 SW, mas patina na faixa de preço em que atua: Golf, Stilo e Focus são bem melhores no interior. Ao menos é melhor que o EcoSport, mesmo após a remodelação deste.
Posição de dirigir 8 – Outro forte da linha Palio. Boa posição, pedais e volante centralizados, ótimos bancos. Um senão vai para o volante, muito simples e muito grande, e a manopla de câmbio igualmente vinda da terra dos gigantes.
Instrumentos 10 – Traz o básico, mais computador de bordo, e bússola e inclinômetro longitudinal e lateral importados do Idea Adventure. É um dos painéis mais completos do mercado. A grafia amarela e a iluminação não comprometem. Os números do velocímetro, no entanto, estão muito próximos.
Itens de conveniência 5 – Deixa como opcionais os diferenciais: airbag duplo e lateral, ABS, sensor de estacionamento e até mesmo o rádio com mp3. Está longe de ser pelada, mas o conjunto trio + ar + direção já não convence na casa acima de 50 mil.
Espaço interno 7 – Bastante razoável, dado o entreeixos maior do que os de Palio e Siena. Os bancos da Fiat, amplos e de bom suporte, não tentam “mascarar” a falta de espaço interno, como fazem alguns carros da Ford, EcoSport inclusive.
Porta-malas 9 – 460 litros não derrubam ninguém da cadeira, mas são bastante respeitáveis. O estepe é acessível pela parte inferior da carroceria, o que pode ser um inconveniente para alguns.
Motor 8 – Chegou num estágio excelente. Amplo torque em baixa rotação, potência discreta porém útil, e um consumo de combustível coerente. Com um pouco de modernidade, como um coletor de admissão varável e 4 válvulas por cilindro, poderia chegar na faixa de 130 cv mantendo-se bastante agradável.
Desempenho 6 – Não é um carro de corridas. Vai bem graças ao bom torque, mas a imprecisão do comportamento não inspira confiança. Não dá sustos em ultrapassagens.
Câmbio 4 – Poderia melhorar bastante. Está a anos-luz da maioria dos GM, mas ainda possui engates um tanto imprecisos e aquela manopla estilo bola de basquete não ajuda. O anel-trava do engate da ré também poderia ser eliminado. Por fim, o motor torcudo permite o uso de uma 5ª marcha mais longa, para menos consumo e barulho em estradas. A Fiat está devendo no quesito câmbios mais longos.
Freios 3 – É tradição da Palio Weekend frear mal. O conjunto é subdimensionado, ainda mais na Locker, que é mais pesada. No entanto, como o carro não inspira grande confiança para se andar rápido, os freios acabam se provando suficientes.
Suspensão 6 – O conceito aqui é curso longo para o fora de estrada, e baixa resistência. Atende bem ao propósito e ainda garante uma condução suave e confortável na cidade.
Estabilidade 3 – Suspensão mole, carro alto, pneus de uso misto. Desastre na certa. A Locker deve ser usada na terra, e em passeios tranqüilos. Nada de correr.
Segurança passiva 4 – Os pontos que ganha são pela oferta opcional de air bag lateral, embora pedir esse opcional possa levar a uns 400 dias de espera pelo carro. Assim como a maioria dos carros em sua faixa de preço, já deveria oferecer airbag duplo e ABS de série.
Custo-benefício 2 – Nota bastante pessoal. 53 mil me compram muitos outros carros bem mais interessantes do que a Locker. Gente que faz um off-road mais sério deve ir de Ranger ou S10. Gente que não coloca o carro na terra deveria assumir isso. As suspensões de fábrica da maioria dos carros à venda no País já suportam bem o nosso piso destroçado. Se você acredita se encaixar no público que pega um off-road leve, mas não tão leve, ou cricula com muita freqüência em asfalto realmente lastimoso, aí pode aumentar a nota da Palio alguns pontos. Mas olhe com carinho para a concorrência.
Comentários
1 - Todas as Palios Week. Locker tem Abs e Air-Bags...não são opcionais, mesmo por que o sensor que desliga o diferencial blocante é o leitor de veocidade da roda traseira esquerda do abs.
2 - É meio relativo se falar em comprar uma Ranger ou S-10 ao invés da Palio, por que apesar delas realmente serem mais aptas a pegarem no pesado, são cabine simples (levam teoricamente só 2 pessoas - 3 apertadas - ) tem seguros e manutenção muito mais caros, são bem piores de dirigir, consomem muito mais e pulam muito no uso na cidade (são desconfortaveis).
3 - Um detalhe que vc esqueceu de citar é que os amortecedores dessa palio tem um sistema de dupla mola (um coil-over com mola interna e externa) de forma que ele atue com carga "firme" apenas numa condição de exterma solicitação e mais soft no uso normal. Tanto que o comportamento dela é melhor que das ultimas versões adventure na rua e na terra.
4 - Barata não é, mas é menos do que pedem por um CrossFox (55mil) e um Eco basico (56mil).
1. Não. ABS e Air bag são vendidos à parte na Palio Locker e custam R$ 3061, de acordo com o site da Fiat.
2 - Como frisei no texto, as picapes justificam todos esses problemas com a aptidão para o fora de estrada. A Palio Locker tem bem pouca vantagem na terra em relação a um carro 4 x 2 normal, exceção feita ao uso de pneus mistos na Locker, que ajudam bastante.
3 - Verdade. Mas com o custo do carro ter piorado muito no uso na cidade, ficando molenga e sem precisão direcional, como a própria revista Quatro Rodas aponta.
4 - Porém mais do que pedem por uma S10 (46 mil), Ranger Sport (50 mil) e carros não aventureiros mais interessantes, como Focus 2.0 (52 mil) e Punto 1.8 (47 mil).
como você comentou a própria revista quatro rodas resume desta forma: o carro perdeu em estabilidade e ganhou em conforto e em habilidade - na teoria - para o fora-de-estrada.
Pois bem diante desta citação lhe pergunto: qual é o limite máximo aceitável para utilização de um veículo com estas características no asfalto? A que velocidade torna-se crucial o seu controle, se o repórter se referiu a estratosféricos 169,2 km/hora, velocidade atingida nos testes, concordo que tal veículo não tenha sido projetado para tais "aventuras", mas será que ao utilizarmos dentro das características normais de nossas rodovias onde na maioria não podemos passar dos 130 km/h, o veículo também têm um comportamento extremado como sugere o tom da reportagem?
Há poucos dias tive a oportunidade de realizar um test-drive da locker, pelo pouco que andei e pela velocidade máxima que pude alcançar (120 km/h) ela não me pareceu tão instável como a reportagem poderia sugerir. Infelizmente não pude testá-la em uma região de serra, com curvas fechadas, e que a fariam mostrar mais as suas reais características e se a solução efetuada pela engenharia de dotar a sua suspenção de dois estágios, cumpre a que se propõe. Portanto creio eu que dentro de uma condição normal de uso não devam ocorrer maiores problemas. Tive a oportunidade de viajar com uma palio 1.3, em duas situações leve e com meia carga, comparando com o meu carro particular (corsa sedan) realmente em algumas curvas temos de tomar a precaução de entrarmos em menor velocidade, mas nada que também a crucifique como sendo totalmente insegura, a sua suspenção mais mole, propicia a carroceria inclinar um pouco mais em curvas mais fechadas.
É uma pena que a reportagem não mencione um antigo dado que constava em testes anteriores (força lateral) talvez ao apresentar tais números podemos ter uma comparação mais real entre as condições de estabilidade de um ou outro veículo. Uma pena foi a fiat ter lançado a palio trekking somente com motor 1.4, pois o mesmo assim como o 1.3 careçe de mais força para tocar um veículo com as características da palio (familiar, bagagem, etc.) Se você têm algum dado para acrescentar quanto ao quesito estabilidade, gostaria que se pronunciasse, pois do contrário em todas as matérias que vi até o momento parece quer querem infundir na locker o mesmo stigma do "escort" (mole demais, instável, capota, etc.). A estabilidade de um veículo realmente é um dos dados elementares a ser esclarecido, se tal veículo hoje apresenta um comportamento que possa provocar e gerar um receio aos condutores, é obrigação da engenharia da fiat em repensar tal situação, adequando ao seu produto características mais apropriadas à sua maior utilização, assim ao proprietário que desejasse adquirir um veículo com esta roupagem poderia ser oferecido um kit (suspenção, pneus, amortecedores) mais adaptado ao asfalto ou outro com pretensões para o off-road, assim como você próprio citou, muitos consumidores adquirem tais veículos mais interessados na sua roupagem, do que necessariamente utilizá-los em condições fora-de-estrada.Gostaria de saber as suas considerações sobre o que mencionei acima, visto que assim como mencionou gosto não se discute e inclinado em adquirir um veículo com estas características, procuro me cercar das maiores informações possíveis a fim de não errar na compra.
Insegura para uso na cidade com certeza não ficou. A avaliação depende muito do uso que vc faz dela. Se vc é uma pessoa que sempre entra devagar em curvas, com certeza essa imprecisão não vai incomodar. Agora, se vc gosta de "sentir" o carro, fazer curvas um pouco mais rápido, enfim, se envolver mais com o ato de dirigir, aí essa questão passa a ser um problema.
Não é motivo para recall, apenas para que os condutores saibam qual é o estilo do carro.