Descanse em paz, Ford




Enquanto a GM ameaça, a Ford foi lá e fez: anunciou essa semana o fechamento de sua icônica fábrica em São Bernardo do Campo, adquirida da Willys em 1967 e de onde saíram modelos históricos para o Brasil como Maverick, Corcel e Escort. Com isso, cessa a comercialização do Fiesta no Brasil e também a linha de caminhões da empresa.

O que aprendemos com essa triste decisão?

1.   Que o capitalismo norte-americano passa por um momento de crise institucional.

Calma, este não é um blog comunista. O que existe hoje no modelo de capitalismo liderado pelos acionistas e grupos privados de fundos de investimento é uma priorização muito pouco saudável do acionista e do retorno sobre o capital. Trata-se de sempre aumentar margens e enxugar custos, reduzir investimentos em prol de remunerar um acionista que colocou dinheiro na empresa e quer resultados máximos em curto prazo. Isso adoece as empresas e compromete seu futuro. Nas empresas europeias o fenômeno é menor, pois a cultura é diferente.

2.   Que o mundo é global.

Para uma fábrica ficar onde está, é preciso que faça sentido. Que existem fornecedores, energia, logística, mão de obra, mercado consumidor. O Brasil, com sua infraestrutura abominável, tributação bizantina, população com baixo poder aquisitivo, é atrativo pelo tamanho da população e pelo protecionismo que favorece quem produz localmente. Se até a China já enfrenta a competição de países como Vietnã que oferecem mão de obra ainda mais barata e condições mais favoráveis, que dirá o Brasil.

3.   Que a Ford está se preparando para ser comprada.

Ao livrar-se de gorduras como fábricas ociosas e linhas de produtos que não são o foco principal da empresa, a Ford pretende enxugar sua operação e com isso tornar-se atrativa para uma aquisição ou fusão. Sergio Marchionne dizia que no futuro teremos um punhado de fabricantes no mundo todo, e ele está certo. O caminho da consolidação é inexorável nos mais distintos setores. A Ford será uma fabricante de SUVs e picapes redondinha, pronta para ser mesclada com o Grupo Volkswagen, que se beneficiaria da força da Ford nos EUA, e da expertise nos segmentos acima, que complementam maravilhosamente a pujança da VW em automóveis.

No M4R ficamos profundamente entristecidos com os rumos que a empresa vem tomando. Ficamos abismados ao ver que a criadora do Modelo T, do Ford V8, do Mustang, do Taurus, do Escort, do Maverick, de tantos e tantos modelos absolutamente seminais da história do automóvel tenha se reduzido a uma fabricante de SUVs e picapes pronta para ser comprada.

No Brasil, por muitos anos e em muitos segmentos o carro da Ford era a referência em acabamento, conforto, potência, dirigibilidade. Teve o Galaxie, carro da presidência por décadas; o Maverick, sonho de consumo até hoje; o Escort igual ao europeu com os inesquecíveis XR3 e Conversível; o Fiesta, que era uma excelente proposta de carro compacto quando começou a ser fabricado em Camaçari e que depois se tornou o show de design e dirigibilidade na versão que acabou de ser descontinuada, além de ter gerado o EcoSport que inaugurou o segmento de SUVs compactos; o Fusion, que colocou o segmento de carros grandes de cabeça pra baixo e depois, ao igualar-se ao Mondeo, tornou-se um dos modelos mais bonitos e equipados à venda no Brasil e nossa menção mais que honrosa vai para o Focus, que sempre encarou com dignidade um dos rivais mais temíveis de todos os tempos – Golf – e, junto com este, sempre foi um dos dois melhores modelos médios disponíveis no Brasil.

Descanse em paz, Ford. Sua ausência será sentida.

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