Teste: Peugeot Hoggar 1.4 XR

Cobrindo uma falha grave do M4R, o primeiro teste de uma picape compacta vem na forma de uma Peugeot Hoggar XR 1.4.

Esclarecendo desde já, não gosto de picapes. Vejo-as como veículos de trabalho, para pessoas que precisam levar grandes volumes de carga para cima e para baixo. Comprar uma picape para rodar com a caçamba vazia é uma opção com a qual simplesmente não concordo, tanto pelos motivos práticos e óbvios, como levar somente duas pessoas na maioria dos casos, como sacrificar a dirigibilidade em nome de uma suspensão traseira robusta, capaz de levar centenas de quilos de carga, e cujo potencial nunca será utilizado. Mas é uma questão de gosto.

Comecei o teste me livrando desta ideia e pensando na verdade no que um executivo de uma montadora disse há alguns meses, mencionando que as picapes compactas são os cupês esportivos do Brasil. Eu prefiro um cupê esportivo de dois lugares de verdade, mas há uma certa razão nesta afirmação. As picapes compactas comportam somente duas pessoas com conforto, são leves e costumam ter motores potentes: nenhuma delas é 1.0.

Mas o que fez mais sentido foi a reação da Peugeot ao entrar mais forte numa curva bem conhecida, e de asfalto ondulado. A traseira pulou, ficou leve, quis pular a dianteira. Tirei o pé do acelerador e, óbvio, a coisa só piorou. Plantei o pé novamente no acelerador e a picapinha tomou seu rumo.

Fosse uma curva de um autódromo, com tomada de tempo, e teria sido péssimo. Sendo uma curva da vida real, foi muito divertido. Uma reação parecida com a de um compacto brilhante, o Ka, conhecido pela traseira alegre ao se tirar o pé do acelerador numa curva. Então a afirmação do executivo começou a fazer mais sentido.

Claro que a intenção primária das picapinhas não é essa. Com a Hoggar, a Peugeot entra num segmento que só existe no Brasil e que movimenta uma boa parcela do mercado. E os franceses fizeram a lição de casa: há uma versão básica para o trabalho, uma intermediária (a XR, testada), e a Escapade, a aventureira praticamente obrigatória.

O estilo é o do 207 na frente, e uma bagunça na traseira. É muitíssimo melhor do que o 207, já que a traseira e a lateral são novas. No geral, não é feia, mas é difícil achar alguém que tenha achado a Hoggar bonita. Dentre as picapinhas, o primeiro lugar no quesito fica definitivamente com a Saveiro.
O interior é o do 207, ou seja, painéis de porta do 206 e painel do 207, tudo revestido de um plástico duro e áspero. O que faz sentido na versão de entrada, veículo para o trabalho, mas estava bem fora do lugar na 207 XR. Não deixa de ser triste que o acabamento do 206, que era um dos melhores entre os pequenos, ter sido piorado a este ponto.

Dirigindo, no entanto, o quadro melhora bastante. A troca do acionamento do câmbio, feito agora por varas, operou quase um milagre e colocou-o num alto nível. Somando-se a pedais macios e muito bem posicionados, e um volante de peso correto e ótima pega, a 207 é uma delícia de dirigir.

Seria melhor ainda caso o banco pudesse ser corretamente ajustado. A falta de regulagem de profundidade do volante soma-se ao espaço interno apertado. Posicionado totalmente para trás, o banco acomoda um motorista de no máximo 1,84m. Ok, não será um problema para muita gente, mas mesmo assim, complicado.

E o espaço interno é pequeno mesmo. Atrás dos bancos não cabe nada – é tudo na caçamba. Que é grande e ampla, com a maior capacidade de carga da categoria e capaz de levar uma moto. E a porta pode ser totalmente removida, para cargas mais volumosas. A capacidade é de 1151 litros e 660 kg.

O motor é um velho conhecido, o 1.4 de 82 cv a 5250 rpm e 12,9 m.kgf a 3250 rpm. De qualidades, a facilidade para subir de giros e o funcionamento suave. Defeitos, em primeiro lugar os números muito modestos de torque e principalmente potência. A Hoggar responde bem em médias rotações e tem uma boa agilidade na saída, bastante ajudada pelo câmbio de relações corretas e engates precisos, mas quando você realmente pisa fundo o motor arrega e o desempenho da picapinha fica bem abaixo do esperado. E isso sem levar um grama sequer na caçamba.

Os freios são a disco na frente e a tambor atrás, de boa modulação no pedal e uma surpreendente resistência a travarem, ao considerarmos a traseira leve de uma picape.

A suspensão traseira de eixo de torção veio da vanzinha Partner, então teoricamente ela deve ser resistente. O problema é que é tudo Peugeot. O que não é ruim por si só; a 504 picape era mais resistente que uma rocha e existem veneráveis Peugeots rodando pelo mundo todo com muitos anos e quilômetros de serviço. Mas, no Brasil, ainda não vi acontecer. Aqui, Peugeot está mais para leite Glória, o que desmancha sem bater. Sinceramente, fosse comprar uma picape para realmente carregar peso, e eu teria os dois pés atrás. Fosse para usar a turismo, aí a Peugeot ganharia mais crédito.

E foi assim que a Hoggar bateu de frente com um dos conceitos mais antigos do M4R, o de que picapes não servem para diversão do motorista. A excelente posição de dirigir (desde que você não seja muito alto), o ótimo câmbio, de relações bem pensadas, o volante de boa pega e boa sensibilidade, a embreagem leve e de curso curto, os bons freios, tudo isso contribui para a Hoggar ser uma grata surpresa, um carrinho divertido mesmo. Como disse, está longe de ser o mais rápido numa pista, mas a “alegria” da traseira e a facilidade de provocar o sobresterço tornam o dia-a-dia bem diferente, prazeroso para o motorista que curte alguma pimenta.

O M4R continua preferindo um cupê esportivo de verdade, e também valorizando a precisão e a aderência que não são as características mais marcantes de uma picapinha. Mas o motorista que souber provocar a Hoggar vazia terá uma grata surpresa.

Estilo 7 – É o mais bonito da família 207, mas isso não significa que seja bonito e ponto.

Imagem – Tem muito pouco a ver com trabalho. É bastante jovem e urbano, adaptável a homens e mulheres.

Acabamento 6 – Os painéis de porta vêm em plásticos duros e ásperos. A coisa melhora no painel central. É adequado a um veículo de trabalho, mas deixa a desejar para um carro de passeio.

Posição de dirigir 9 – É muito boa, salvo para pessoas muito altas. Não lembra ser um utilitário.

Instrumentos 7 – Vem completo, e com a grafia do 207 europeu. A iluminação em laranja é muito adequada e permite ótimo contraste à noite.

Itens de conveniência 6 – Somente a direção hidráulica é de série. O melhor pacote de equipamentos fica mesmo com a Escapade, mas ao menos o preço não é aviltante.

Espaço Interno 5 – É bastante limitado para pessoas mais altas, pois os bancos vão pouco para trás. Em largura, é satisfatório.

Porta-malas 10 – Caçamba, na verdade. É muito ampla e com boa capacidade de carga. Atrás dos bancos não cabe quase nada.

Motor 7 – Esse 1.4 da Peugeot, assim como o da Fiat, já passou da hora de uma boa repaginada em potência. Não tem como justificar a GM extrair 20 cv a mais na mesma cilindrada. Como qualidades, a suavidade e o bom torque em baixas rotações.

Desempenho 6 – Muito leve, arisca até, a Hoggar se desenvolve bem na cidade com dois ocupantes, mas com certeza sofrerá muito com carga.

Câmbio 9 – Uma melhora substancial diante dos câmbios antigos da linha. Muito suave e de engates precisos, embora de curso um tanto longo.

Freios 6 – Freia bem, com boa progressividade no pedal. No entanto, ABS nem pedindo pro cacique.

Suspensão 7 – O comportamento é muito similar ao de um automóvel, com boa absorção de impactos e estabilidade correta.

Estabilidade 6 – A Hoggar não é o carro mais estável do mundo, muito pelo contrário, mas a suspensão traseira mais dura deixa o carro muito divertido, com tendência sobreesterçante.

Segurança passiva 3 – Air bags dianteiros são opcionais, vendidos sob encomenda. Assim fica difícil.

Custo-benefício 6 – O preço inicial, de R$ 35 mil, é equivalente ao de alguns carros 1.6 bem equipados, como o Fiesta. Com ar-condicionado, o valor vai para próximo dos 40 mil. Está bem posicionada no segmento de picapes, mas como carro, dá pra comprar coisas mais interessantes nessa faixa.

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