Teste: Ford Fiesta Sedan 1.6 Class

No último Salão do Automóvel, em 2008, o carro compacto mais bonito estava no estande da Ford: o estudo Verve, que havia antecipado as linhas do Fiesta que foi lançado na Europa ainda naquele ano. É um carro extremamente elogiado, tanto pela beleza e ousadia das linhas externas e internas quanto pelo padrão de acabamento e dirigibilidade que o europeu já conhece da linhagem Fiesta.

No Brasil o Fiesta nunca alcançou o status do velho continente. Se lá vende muito bem e disputa a liderança do segmento com o Polo, enquanto Grande Punto e Corsa assistem com uma certa distância, aqui o Fiesta ocupa um lugar discreto, tanto nas vendas quanto na propaganda da própria Ford.

Uma grande injustiça. Faltou, à estratégia da Ford, impacto inicial. O primeiro Fiesta que apareceu oficialmente por estas bandas era um quadradinho, importado da Espanha. Vendeu menos que guarda-chuva em dia de sol. Esse Fiesta foi remodelado na Europa e ganhou o apelido brasileiro de “chorão” ou “tristonho”, devido aos faróis ovais. É desta época um dos melhores pocket-rockets já vistos aqui, o Fiesta CLX 1.4 16v Zetec, com motor importado da Hungria e endiabrados 89,5 cv. A picape Courier, oferecida a partir desta geração, também usou o propulsor por algum tempo.

No final da década de 90 o Fiesta foi novamente remodelado na Europa e aqui, ganhando a frente chamada de “gatinho”. Ainda mais importante, os motores foram trocados: saíram os apáticos e barulhentos Endura 1.0 e 1.3, e chegaram os valentes Zetec 1.0 e 1.6, este último um transformador de pacatos Fiestas e Kas em devoradores de asfalto.

Abrindo um parênteses, a própria estratégia da Ford para o Ka prejudicou o Fiesta. Em determinado momento, o Ka era o carro de entrada. Depois, o Fiesta. Nenhum dos dois firmou-se como tal; Ka é carro de nicho, e o Fiesta que deveria encarar Gol, Palio e concorrência.

No início dos anos 00, o Fiesta gatinho 1.0 Zetec competia de igual para igual com concorrentes de renome, como o Palio Fire (mais econômico), Gol G3 (melhor acabamento e mais caro), sendo mais agradável de dirigir que ambos. E vendendo muito menos.

Em 2002 a Ford fez um upgrade completo no carro e trouxe uma geração assemelhada à europeia, porém com conteúdo simplificado. Diz a lenda que tanto Fiesta quanto Fox apostaram numa pesquisa de mercado que havia identificado um nicho interessado em carros altos e simples por dentro. Eu nunca vi um consumidor se interessar por algo pior, mas vá lá.

Muito bonito, o novo Fiesta não estava à altura do antigo no interior: plásticos duros, com rebarbas, tecidos ásperos. Mais pesado, o 1.0 agora amargava um desempenho muito fraco. O compressor, solução interessante, não fez sucesso devido ao alto consumo de combustível e, de novo, ao marketing: enquanto a VW vendia a linha 1.0 16v turbo como verdadeiros esportivos, o 1.0 SC da Ford parecia apenas um milzinho melhorado. O 1.6, entretanto, mantinha as ótimas qualidades dinâmicas da geração anterior.

Em 2007, a Ford alterou a dianteira do carro (para pior, na opinião de muitos) e cuidou com mais carinho do interior, que ganhou tecidos melhores, cores diferentes e um capricho maior na montagem. Vai ficar assim até 2011, quando teremos mais um face-lift de acordo com o modelo indiano, e em 2012 receberemos o verdadeiro Fiesta europeu, lindão, num segmento superior para competir com o Punto. Espero que não venha muito depenado.
Com este cenário, a Ford tomou uma atitude digna: baixou o preço do Fiesta. E um sedã equivalente ao testado, que custaria até R$ 45 mil a valores de mercado, hoje sai por R$ 37 mil. A atração do custo-benefício é muito forte, mas será que o Fiesta ainda tem charme para atrair um comprador?

Se depender do estilo, não. Tanto na forma hatch quanto na sedã, o Fiesta é um carro agradável, de linhas fluidas, mas que não chama a atenção. E ainda por cima concorre com um dos automóveis mais bonitos a aportarem no Brasil nos últimos anos, o Punto. Como se não bastasse, o fato de ter sofrido mínimas alterações desde 2002 já deixou o desenho do Fiesta cansado, embora, por não vender tão massivamente quanto o Palio, o Fiesta não padeça do sentimento de “já deu” que tenho em relação ao Fiat hoje.

O interior revela certo cuidado da Ford: o tecido dos bancos é bicolor, num bonito padrão, e o painel possui dois tons de cinza. As peças são bem encaixadas e não há rebarbas. Por outro lado, as economias tomadas antigamente ainda aparecem: os plásticos são duros, o desenho do painel não é dos mais inspirados, falta peso ao acionamento dos botões (as alavancas são ok).

Bem acertado ergonomicamente, o Fiesta agrada pela posição de dirigir, absolutamente centralizada, pedais de acionamento suave, freio progressivo, banco do motorista e volante com regulagem de altura (mas não profundidade). Os bancos são ótimos, com bom apoio lombar e a densidade da espuma na medida correta. Poderiam ser um pouco maiores nas laterais, para melhor suporte.

Quem também se acomoda bem são os passageiros: o espaço na frente é muito bom e atrás é adequado, dentro do que se pode esperar de carros pequenos. Vai bem em altura e no espaço para as pernas, sendo um pouco apertado em largura.

O porta-malas é muito bom, com 487 litros e dobradiças pantográficas que não invadem o espaço. Uma pena não ser revestido, exclusividade do Polo na categoria.

Na época presidente da Ford, Antônio Maciel Neto protagonizou uma campanha no início da década oferecendo 100 reais a quem fizesse um test drive num carro da marca e optasse por outro. Foi muito acertado. O Fiesta mostra suas verdadeiras qualidades ao ser dirigido: a direção é direta; os pedais são precisos; a embreagem tem curso curto; o câmbio é próximo e tem engates fáceis; e, na frente, o empuxo do 1.6 Zetec, o melhor motor com esta cilindrada e oito válvulas no Brasil. É uma unidade silenciosa e que sobre de giro fácil. O Fiesta entrega ótimo desempenho quando solicitado, embora a relação aberta de marchas longas enfatize o silêncio e conforto de rodagem. A 100 km/h, o Fiesta não atinge 3000 rpm.

E é um carro que não refuga curvas, muito pelo contrário. Poderia ser um pouquinho só mais macio, embora já seja melhor que o Polo neste aspecto (ajudado pelas rodas 14”, contra 15” do VW). É bastante previsível e instiga o motorista a testar seu comportamento dinâmico. Somando-se as respostas do motor e dos comandos com o comportamento da suspensão, tem-se um sedã de dirigibilidade comparável à de modelos médios, um verdadeiro prazer para o motorista.

E o Fiesta vale a pena? Para isso, é necessário olhar a concorrência, que é forte e vasta. Está bem inserido em espaço interno, porta-malas e equipamentos; é inferior à média em acabamento, mas superior em dirigibilidade. No entanto, quem fecha a conta a favor do Fiesta é mesmo o preço: a R$ 37 mil, é mais barato do que quase todos e, na mesma faixa, Corsa e Logan não são tão bons. Uma bela compra.

Estilo 5 – Não é lindo, não é feio, não é moderno, não é antiquado. Está exatamente no meio.
Imagem – É um carro extremamente democrático, visto com homens e mulheres, normalmente mais jovens, com menos de 40 anos. É discreto e não ostenta.

Acabamento 4 – E imaginar que já foi pior. A reformulação realizada pela Ford em 2007 fez bem ao carro, com encaixes melhores e mais cores, mas os materiais continuam muito simples, especialmente no volante.

Posição de dirigir 8 – Centralizada, com os comandos à mão e um curso de pedais correto. Os bancos têm bom apoio, embora falte suporte lateral. O volante não possui ajuste de profundidade.
Instrumentos 7 – Painel bonito e completo, com bonita iluminação em verde. O computador de bordo já é visão comum na categoria, e ainda está ausente do Fiesta.

Itens de conveniência 7 – O Fiesta é “completo” na acepção mais comum do mercado, ou seja, ar, direção, vidros e travas. Pode vir com rodas de liga leve, alarme e faróis de neblina por pouco mais. Os equipamentos que são realmente diferenciados, sejam os de segurança como ABS e air-bag, ou de conveniência como sensores e retrovisor interno fotocrômico, são muito caros ou simplesmente não existem.

Espaço interno 8 – Muito bom para pernas e cabeça de quem vai atrás, embora falte largura para três adultos, mal que aflige toda a categoria com exceção do Logan. Na frente, boas acomodações.

Porta-malas 9 – Espaçoso, com 487 litros e dobradiças pantográficas que não invadem o espaço da bagagem. O único senão vai para a tampa sem revestimento.

Motor 9 – É claro que dá água na boca do entusiasta imaginar um Fiesta, e ainda mais um Ka, com o novo motor Sigma. Mas não vamos desmerecer o bom Zetec: é redondo, sobe rápido de giros e entrega bons torque e potência.

Desempenho 7 – O Fiesta anda bem e entrega potência quando necessário, e não colocaria o motorista em sérios apuros numa ultrapassagem mesmo carregado. No entanto, este não é o foco do carro: existem outros sedãs mais “nervosinhos”; o Fiesta é pacato, mas não nega fogo.

Câmbio 9 – É um dos motivos da placidez do carro: bastante longo, gira o motor a menos de 3 mil rpm a 100 km/h em quinta, com muito conforto e economia em viagens. Também possui engates curtos e precisos.

Freios 6 – Não deixo de ficar um pouco preocupado ao pensar que estes carros podem circular com cinco pessoas, muita bagagem, e tudo atrelado a um sistema de freios com tambor atrás. O Fiesta freia bem, o pedal tem ótima modulação, mas ele, assim como toda a categoria, já poderia ter migrado para os freios a disco traseiros.

Suspensão 7 – O clássico eixo de torção atrás, endurecido, transforma o Fiesta num carro bastante estável, e que como sedã poderia ser mais confortável ao passar por irregularidades.

Estabilidade 9 – O Fiesta responde bem a quaisquer curvas, embora o câmbio longo não estimule muita correria.

Segurança passiva 3 – Air bags e ABS, só como opcionais numa versão impossível do Fiesta a quase R$ 50 mil. A Ford deveria oferecê-los sem combiná-los com outros equipamentos, a um preço mais baixo, como a concorrência já faz.

Custo-benefício 10 – É um dos melhores nesse quesito hoje. Um carro honesto, agradável de dirigir, bem equipado por (significativamente) menos de R$ 40 mil. Um sedã para a família, que pode dar anos de bons serviços, a um preço possível.

Comentários

Anônimo disse…
Dub.. mais uma vez outro post excelente... estou interessado em um Hatch 1.6 Class... dirigi e gostei.. achei a resposta do motor muito boa... mas a minha duvida é se invisto um pouco mais em um Punto 1.4... (Mas me disseram que esse motor do Punto não é dos melhores).. e tb com relação a desvalorização que o Fiesta pode vir a ter com essa reestilizações interminaveis... agradeço se puder me dar uma luz.. hehehe..
André disse…
Muito boa avaliação. Como sempre, muito bem escrita.

Pena o bom Fiesta não vender bem. Mais uma vez, erro de estratégia da Ford. Fazem bons carros pro mercado nacional, mas vendem o que o povo gosta, e que nem é tão bom (leia-se Eco). Com isso, acabam destruindo a imagem. Uma pena pro bom Fiesta e pro excelente Focus. Pra completar, quando entram numa categoria de luxo (Edge), posicionam o preço completamente sem noção. De novo, uma pena.

Excelente post, Dub. Abraço.
andré disse…
Foi mal... Não tem nada a ver com o post, mas achei sensacional...

http://uolcarros.blog.uol.com.br/arch2010-03-16_2010-03-31.html#2010_03-19_15_42_36-132146873-27

E agora, ruindai???
Dubstyle disse…
Anônimo,

o Punto é mais bonito e mais bem acabado que o Fiesta. O Fiesta anda mais e tem comportamento melhor. Dois bons carros, acho mais uma questão de gosto a escolha entre eles do que propriamente um ser melhor do que o outro. E sobre desvalorização, eu não me preocuparia muito: nenhum usado vale nada hoje em dia mesmo...

André,

Concordo. Mas o Edge é importado do Canadá, então não tinha mesmo como ser vendido aqui a preço de Captiva.
Anônimo disse…
É impressão minha, mas toda desculpa que dão para a Ford não vender bem é o tal do erro de estratégia de marketing. Muda o disco.
Tô na Rede disse…
Excelente post. A meu ver existe também, sei lá o porquê, o aspecto cultural, no qual os veículos Ford aqui no Brasil não são muito "bem vistos". A bem dizer, não que os Ford sejam rejeitados: apenas não são considerados na hora da compra. Uma injustiça. Preconceito semelhante, mas que não ocorre com os Ford, acontece com os Fiat (ultimamente, em menor grau), há décadas alvos de chacotas em função de sua suposta fragilidade, e de forma oposta, surgem os VW, afamados como veículos confiáveis e duráveis (o que atualmente também deixou de ser consenso).
Anônimo disse…
O Punto 1.4 tem o mesmo motor beberrão do Corsa, ou seja, é um vhc 1.4 da Powertrain. Não quero nem saber de um motor MANCO destes. Fiesta mil vezes, mesmo tendo um acabemento ruim, diga-se de passagem, muito pior do que o do Corsa.
Anônimo disse…
O Punto 1.4 tem o mesmo motor beberrão do Corsa, ou seja, é um vhc 1.4 da Powertrain. Não quero nem saber de um motor MANCO destes. Fiesta mil vezes, mesmo tendo um acabemento ruim, diga-se de passagem, muito pior do que o do Corsa.
Anônimo disse…
O Punto 1.4 tem o mesmo motor beberrão do Corsa, ou seja, é um vhc 1.4 da Powertrain. Não quero nem saber de um motor MANCO destes. Fiesta mil vezes, mesmo tendo um acabemento ruim, diga-se de passagem, muito pior do que o do Corsa.
Anônimo disse…
Acabamento ruim do Fiesta...? Onde? A ford tem os carros com os melhores acabamentos. Ate o ford ka tem o acabamento melhor do que os carros da GM e da VW. Vendagem baixa? A Ford e a fabrica que mais vende carros no Brasil. Vai procurar um Fiesta na Concessionaria Zero km e ve se vc consegue achar um ou mais pra comprar. Tem gente que fala muita merda nos comentarios.
Gentil disse…
Gostei da matéria, porém senti falta da abordagem de um item a meu ver muito importante: O CONSUMO DE COMBUSTÍVEL. portanto gostaria de saber qual a média de Km-litro(gasolina)para um Fiesta Sedan 1.6 - Ano 2010.
Grato,
Gentil

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